Pequenos empresários recorrem à China para cortar custos do ‘made in Brazil’

A China tem se tornado um calo no sapato do empresário Marcelo Pereira, que começou a perder mercado diante da invasão dos produtos do gigante asiático devido, principalmente, à desvalorização da moeda local. Já que não era possível livrar-se desse incômodo, ele embarcou rumo ao país, que tem a segunda maior economia do mundo, em busca de alianças. “O jeito vai ser comprar um sapato maior”, disse.

Neste final de semana, um grupo de pequenos e médios empresários viaja para a China para participar da que é considerada a maior e mais importante feira multissetorial daquele país, a Canton Fair.

Dono de uma pequena fábrica especializada em pinceis e esponjas de maquiagem instalada em São Bernardo, região metropolitana de São Paulo, Pereira estará na China neste final de semana para negociar a compra de matérias-primas diretamente com os fornecedores, a fim de baratear as peças que produz no Brasil. Hoje, 80% dos insumos utilizados pelo empresário vêm de fornecedores nacionais e 20% de outros países. Porém, não tem sido suficiente para manter seus preços em níveis competitivos.

Ao ter a China como principal fornecedor, Pereira também adota outro mecanismo de redução de custos. Isso porque a maior parte dos produtos que compra dos Estados Unidos ou de países europeus tem origem chinesa.

“Uma vez fiz uma importação da Alemanha. Mas, quando os pacotes chegaram, abri e vi um monte de jornal picado chinês. Não compensa, porque a gente acaba pagando mais”, disse o dono da Corel Pincéis, que produz cerca de 1 milhão de peças por mês e tem como clientes as maiores empresas de cosméticos do país.

No entanto, o aumento da utilização de matéria-prima chinesa não se traduz em perda de qualidade da produção, conforme defendeu o empresário. “Quero continuar fabricando, industrializando os produtos. Seria fácil virar representante comercial [de produtos prontos chineses]. Mas isso [importar mais produtos da China] não significa menos qualidade. O mercado interno é exigente e aceita pagar de 5% a 10% a mais se [o produto] for mesmo de qualidade.”

Tratando de se proteger contra a concorrência dos próprios chineses, o dono de uma pequena fábrica de produtos eróticos também decidiu ir à China tentar negociar diretamente com seu rival. Para oferecer preços mais baixos aos seus clientes, Márcio Luiz, diretor da Power Sexy, pequena fábrica de produtos eróticos, está à procura de novos fornecedores, a que ele dá o nome de “parcerias”. Ao optar pela importação de peças chinesas, o empresário reduz seus custos de forma significativa.

“Hoje, temos uma trading que importa alguns produtos. Os Estados Unidos são um importante exportador. O problema é que eles não fabricam nada. Mas o Brasil não precisa mais dos Estados Unidos. Consegue comprar diretamente da China, pela metade do preço”, contou.

Dificuldade com língua ajuda
A burocracia imposta no processo de importação de produtos chineses, bem como a falta de habilidade para se fazer negócios, devido à língua e a cultura diferentes, com chineses se transformam em vantagem para esses pequenos fabricantes que abastecem o mercado interno. “Essa dificuldade é o que faz o mercado internacional preferir comprar por aqui. Levamos vantagem indo até lá. É mais fácil de negociar cara a cara”, disse Marcelo Pereira.

Alianças para investimento
O objetivo de outros empresários, além de comprar insumos mais baratos, é conseguir investidores para seus negócios. O empresário Pérsio Walter Bortoloto é diretor da Eletrosinal, fábrica instalada em Maringá, no norte do Paraná, especializada em produzir semáforos “inteligentes”. Como possui patente em outros países, já que seu produto é inovador, Bortoloto quer atrair a atenção de chineses para expandir sua pequena indústria – hoje, familiar.

“Precisamos de investimentos para entrar em novos mercados. Os chineses estão investindo em várias áreas do mundo. Estão com muitos recursos. Dá para trabalhar lá fora e trazer divisas para o Brasil.”

De acordo com Marina Schwartzman, coordenadora de Negócios no Brasil da Câmara Brasil-China de Desenvolvimento Econômico (CBCDE), a entidade estuda a possibilidade de montar um estande na Canton Fair para expor os produtos dos pequenos empresários brasileiros.

“Para vender para os chineses, é preciso planejamento, conhecimentos sobre distribuição… é preciso insistência. O consumo de produtos brasileiros no exterior tem aumentado. Calçados, alimentos, moda…têm chamado a atenção dos chineses. Há alguns que até exportam mel e própolis”, comentou.

Balança comercial
Tradicional parceiro comercial brasileiro, os Estados Unidos têm perdido espaço a cada ano para a China, que já é o principal destino das exportações brasileiras. Na década de 1990, os chineses representavam apenas 1,8% dos cerca de US$ 482 bilhões exportados pelo Brasil. Nos dez anos seguintes, quando o volume de exportações total foi de US$ 1,13 trilhão, a participação chinesa cresceu para 8,3%.