Biotecnologia chinesa supera inteligência artificial e atrai olhares do mundo inteiro

Setor vive boom financeiro, impulsionado por megacontratos globais, IPOs de sucesso e o retorno de talentos — com implicações promissoras para o Brasil

(Foto: Reprodução / Shutterstock)

Enquanto os olhos do mundo ainda estão voltados para os avanços da inteligência artificial, a biotecnologia chinesa surge como protagonista inesperada dos mercados em 2024. Com uma valorização de mais de 60% no índice Hang Seng Biotech, o setor tem superado, em rentabilidade, até mesmo os gigantes da IA. O feito não é pequeno — e está atraindo atenção de investidores globais, inclusive brasileiros.

O movimento foi impulsionado por dois acordos bilionários que colocaram empresas chinesas no radar das grandes farmacêuticas internacionais. A americana Pfizer desembolsou US$ 1,25 bilhão para licenciar um tratamento experimental contra o câncer da chinesa 3SBio, além de investir US$ 100 milhões em ações da empresa. Pouco depois, a Bristol-Myers Squibb fechou um contrato de US$ 11,5 bilhões com a alemã BioNTech por um fármaco oncológico que também tem origem chinesa, da Biotheus Inc.

Esses acordos reacenderam o otimismo em torno da biotecnologia da China — agora vista não mais como promessa, mas como uma força consolidada no cenário global de inovação farmacêutica. Empresas como a RemeGen Co., especializada em anticorpos terapêuticos, registraram alta de 270%, e o apetite por novas ofertas públicas de ações (IPOs) só aumenta.

Brasil acompanha com interesse estratégico

O crescimento da biotecnologia chinesa pode ter implicações diretas para o Brasil. Em um momento em que o país busca diversificar suas parcerias em ciência, tecnologia e saúde, a China surge como um parceiro natural. Os dois países já têm histórico de cooperação na área da saúde — como nas vacinas durante a pandemia — e o avanço tecnológico chinês pode representar uma nova janela de oportunidade.

“É o tipo de inovação que interessa ao Brasil: ciência aplicada, com potencial de democratização do acesso e ganhos em escala”, afirma Carla Beatriz Mota, pesquisadora da Fiocruz, que acompanha parcerias internacionais na área de biotecnologia. Para ela, o Brasil pode se beneficiar tanto de acordos comerciais quanto de intercâmbios científicos com empresas e universidades chinesas.

Fusões bilionárias e o retorno dos cérebros

A valorização não é apenas especulativa. O primeiro trimestre de 2024 registrou US$ 36,9 bilhões em fusões e aquisições com participação de empresas chinesas — mais da metade do volume global no setor. Além disso, a volta de cientistas e executivos chineses que atuavam nos EUA tem fortalecido a capacidade de inovação dentro do país asiático.

Para Nicholas Chui, da Franklin Templeton, esse movimento de “repatriação intelectual” tem sido crucial para aumentar a competitividade da China frente a centros tradicionais como Estados Unidos e Europa. É um sinal claro de resiliência, inclusive diante das tensões comerciais com Washington.

Cautela nos investimentos, mas fundamentos sólidos

Apesar do entusiasmo, alguns analistas mantêm cautela. O Bank of America pondera que os recentes contratos bilionários podem ser pontuais e que investidores mais conservadores ainda preferem empresas com dividendos regulares e crescimento previsível.

Ainda assim, o sentimento geral é de confiança. Para Dong Chen, estrategista da Pictet Wealth Management, o setor de biotecnologia da China vive seu “momento DeepSeek” — em referência ao fenômeno recente da IA chinesa — e deve continuar crescendo nos próximos trimestres.

Um novo polo global de inovação?

A biotecnologia pode ser o novo grande motor da economia chinesa — e, por extensão, da cooperação com países emergentes como o Brasil. Se a trajetória se mantiver, veremos não apenas remédios inovadores sendo desenvolvidos em cidades como Xangai e Shenzhen, mas também uma crescente influência da China nos rumos da saúde global.

Nesse cenário, o Brasil pode — e deve — buscar se aproximar, seja via agências de pesquisa, universidades ou acordos bilaterais. Afinal, quando ciência, tecnologia e geopolítica se encontram, quem se antecipa sai na frente.

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