As tentativas do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de enfraquecer o Brics podem estar produzindo justamente o efeito contrário. Ao impor tarifas punitivas a países do bloco, a Casa Branca criou um terreno fértil para maior aproximação entre Brasil, China, Índia, Rússia, África do Sul e os novos integrantes do grupo.
Na última semana, a Índia viu as taxas americanas sobre seus produtos saltarem para 50%, metade delas em represália à compra de petróleo russo. O Brasil já é alvo de uma tarifa geral de 50% em meio ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro. A China corre risco de enfrentar tarifas de até 145%, enquanto a África do Sul já recebeu uma sobretaxa de 30%. Até mesmo novos membros, como o Egito, podem ser penalizados por sua adesão ao Brics.
Tarifaço gera união inesperada
Especialistas apontam que, ao punir simultaneamente diferentes países do Brics, Trump deu ao grupo um “incentivo comum” para acelerar acordos em moedas locais e reduzir a dependência do dólar. Bancos centrais do bloco já aumentaram a compra de ouro, sinalizando a busca por maior autonomia financeira.
No Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que pretende articular uma resposta conjunta às tarifas. Pequim, por sua vez, reforçou o discurso de que “a América Latina não é quintal de ninguém”, fortalecendo laços comerciais com a região, onde já figura como principal parceiro do Brasil.
Índia reaproxima-se da China
Outro reflexo inesperado foi a reaproximação entre Nova Délhi e Pequim. Pressionada pela tarifa de Washington, a Índia flexibilizou vistos, retomou voos diretos para a China e iniciou conversas sobre fornecimento de minerais de terras raras. Esses elementos são cruciais para a produção de veículos elétricos e tecnologias de defesa.
Embora ainda haja desconfiança indiana sobre as ambições chinesas na Ásia, analistas veem a cooperação econômica como inevitável diante das pressões externas. Para o Brasil, essa reaproximação abre espaço para novas dinâmicas no bloco, em que a China segue como maior parceira comercial brasileira.
Comércio intra-Brics em ascensão
De acordo com estudos recentes, o comércio entre países do Brics cresce mais rápido que o comércio com o G7, mesmo diante de barreiras ainda significativas. Iniciativas como a bolsa de grãos do Brics, campanhas de incentivo a produtos do bloco e expansão do uso de moedas locais devem ganhar força nos próximos anos.
Economistas projetam que, embora o dólar continue dominante, sistemas paralelos de liquidação em yuan, rúpia e rublo irão minar gradualmente seu monopólio.
Brasil e China no centro das mudanças
No meio dessa disputa global, Brasil e China reforçam sua parceria estratégica. Enquanto o agronegócio brasileiro segue batendo recordes de exportação para o mercado chinês, Pequim se consolida como fonte de investimento em infraestrutura, energia e tecnologia no Brasil.
As tarifas de Trump, que visavam dividir, podem acabar tendo o efeito inverso: consolidar o Brics como um polo alternativo de poder econômico e político no cenário internacional.