Rússia quer Brasil como parceiro estratégico para preencher lacunas deixadas por empresas ocidentais

Com apoio parcial da China, Moscou busca ampliar a presença brasileira em setores industriais, engenharia e consumo

(Foto: Reprodução / Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação)

Em meio à reconfiguração dos mercados globais provocada pelo conflito na Ucrânia, a Rússia voltou seus olhos ao Brasil como potencial parceiro para preencher lacunas deixadas por empresas ocidentais. A sinalização partiu diretamente do vice-ministro da Economia da Rússia, Vladimir Ilyichev, durante o Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo, realizado nesta semana.

Segundo Ilyichev, setores inteiros do mercado russo ainda estão desabastecidos após a saída de companhias norte-americanas e europeias que romperam laços com Moscou desde 2022, quando sanções internacionais foram intensificadas. Embora empresas chinesas tenham ocupado espaço relevante — especialmente na indústria automobilística e em telecomunicações —, há segmentos em que a China não atua com tanta força. É nesse ponto que entra o Brasil.

“Empresas brasileiras podem ocupar alguns dos nichos que ficaram vagos em nosso mercado e que ainda não foram preenchidos por nossos colegas chineses”, afirmou Ilyichev, sugerindo áreas como engenharia, bens de consumo e indústrias especializadas.

Brasil e Rússia: parceria em ascensão

O comércio bilateral entre Brasil e Rússia já vinha crescendo nos últimos anos, atingindo em 2024 a marca recorde de US$ 12,4 bilhões. Fertilizantes, derivados de petróleo, metais e alimentos compõem o grosso das transações, mas há espaço para diversificação — inclusive no setor de energia nuclear, segundo o vice-ministro.

Para o Brasil, a abertura russa representa uma oportunidade estratégica. Com a China consolidada como o maior parceiro comercial brasileiro, a Rússia desponta como um mercado alternativo — especialmente relevante num momento em que o mundo se fragmenta em blocos econômicos influenciados por tensões geopolíticas.

A busca por parceiros “não hostis” levou Moscou a intensificar relações dentro do BRICS, grupo que reúne, além da Rússia e Brasil, China, Índia e África do Sul. Em meio a esse realinhamento, empresas brasileiras têm a chance de ocupar posições privilegiadas em áreas que vão da agroindústria à tecnologia, passando por infraestrutura e bens manufaturados.

Relação com a China amplia potencial da triangulação

Nesse novo cenário, a China desempenha papel central não só como parceira preferencial da Rússia, mas também como ponte indireta para empresas brasileiras. Algumas multinacionais do Brasil já operam na Ásia com joint ventures ou fornecimento de peças e insumos para o mercado chinês. Isso pode facilitar uma eventual integração com cadeias produtivas russas.

Por outro lado, a concorrência com a China será inevitável em certos setores. A diferença, segundo analistas, está na flexibilidade que o Brasil pode oferecer com soluções sob medida e em menor escala, especialmente em nichos ainda não absorvidos por gigantes chineses.

“Portas fechadas” ao Ocidente e novos caminhos ao Sul Global

As declarações dos executivos russos foram enfáticas quanto à rejeição a uma possível reaproximação com companhias ocidentais. “Eles saíram batendo a porta, abandonando tudo. Não há mais confiança”, afirmou Mikhail Oseevskiy, CEO da Rostelecom. A fala ecoa a posição do conglomerado Rostec, peça-chave na indústria de defesa, que também anunciou a exclusão definitiva de parceiros europeus e americanos.

Com as portas fechadas ao Ocidente, o Sul Global ganha relevância. Para o Brasil, trata-se de um momento propício para reposicionar sua presença no cenário internacional, ampliando parcerias em mercados não tradicionais e, ao mesmo tempo, mantendo laços com seus maiores aliados comerciais, como a própria China.

A bola está com as empresas brasileiras. O mercado russo está em transformação — e busca novos protagonistas.

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