As negociações entre Estados Unidos e China para evitar uma nova rodada de tarifas chegaram ao fim sem qualquer avanço concreto. O encontro, que vinha sendo acompanhado com atenção por governos e mercados ao redor do mundo, terminou nesta segunda-feira (29) com clima de frustração e incerteza. A ausência de um acordo reabre o risco de aumento de tarifas bilionárias sobre produtos chineses — o que pode desencadear novos desdobramentos na já frágil geopolítica do comércio global.
Do lado americano, o governo de Donald Trump sinalizou que poderá implementar até o final de agosto uma nova leva de tarifas sobre mais de US$ 30 bilhões em importações da China, com foco em setores como tecnologia, semicondutores e equipamentos industriais. A justificativa gira em torno de práticas comerciais “desleais” atribuídas a Pequim, incluindo supostos subsídios e espionagem industrial — acusações que a China rejeita categoricamente.
Autoridades chinesas, por sua vez, demonstraram frustração com o que consideram falta de flexibilidade dos negociadores dos EUA. Embora tenham reafirmado o interesse em manter o diálogo aberto, Pequim já deixou claro que retaliará proporcionalmente caso as tarifas sejam efetivamente aplicadas.
O novo impasse representa mais do que um ruído bilateral: ele coloca pressão sobre cadeias produtivas inteiras, do agronegócio à indústria eletrônica, passando por setores como automotivo, farmacêutico e de energia renovável. E é nesse cenário que o Brasil entra como peça-chave.
Brasil entre os gigantes
A crise entre as duas maiores potências econômicas mundiais amplia o espaço para o Brasil fortalecer suas relações comerciais — tanto com a China, quanto com os próprios Estados Unidos. A depender da rota que o conflito tomar, o país pode ser visto como fornecedor alternativo de produtos como soja, minério de ferro, carnes e até itens industrializados. Mas essa “janela de oportunidade” vem acompanhada de riscos.
Um aumento das tarifas pode significar menor crescimento global, desaceleração na demanda por commodities e mais volatilidade nos mercados financeiros. Em especial, a China tende a reorientar seu comércio com parceiros mais confiáveis, e o Brasil, se agir com inteligência, pode se beneficiar desse movimento. Não à toa, setores como o agro, a tecnologia e a energia verde têm recebido mais atenção nos fóruns bilaterais Brasil-China nos últimos meses.
Por outro lado, o governo brasileiro terá que manter um jogo de equilíbrio. Reforçar laços com Pequim pode ser malvisto por Washington — especialmente em um ano eleitoral nos EUA, em que temas como “autonomia produtiva” e “contenção da China” dominam os discursos. Nesse cenário, qualquer gesto simbólico ou comercial pode ganhar interpretações geopolíticas.
O mundo em modo cautela
Enquanto os mercados reagem com instabilidade, os diplomatas trabalham para manter os canais abertos. Mas o recado que fica é claro: a era das guerras tarifárias ainda não terminou, e o multilateralismo segue fragilizado. O Brasil, que há décadas defende soluções negociadas e integração sul-sul, pode ter um papel relevante como articulador de pontes — especialmente no contexto do BRICS e da presidência brasileira do grupo neste ano.
O que está em jogo não são apenas tarifas ou percentuais de crescimento, mas a arquitetura futura do comércio internacional. E nesse novo tabuleiro, o Brasil precisa se posicionar com estratégia, previsibilidade e diplomacia ativa. Porque quando os gigantes brigam, os demais não podem se dar ao luxo de ficar parados.