Com o nome da mítica deusa lunar chinesa, a sonda lunar robótica Chang’e-5 foi lançada com sucesso da base de lançamento de naves espaciais de Wenchang, na província de Hainan, em 24 de novembro de 2020. Depois de mais de 20 dias em órbita, a sonda trouxe de volta à Terra cerca de dois quilos de amostras lunares. A expedição é um novo marco na história do setor espacial chinês, anunciando que a segunda
maior economia do mundo tem agora a capacidade de viajar entre a Terra e a Lua. Ao mesmo tempo, lança um sólido alicerce para as futuras explorações lunares e planetárias do país.
Amostras lunares – A sonda Chang’e-5, desenvolvida pela Corporação de Ciência e Tecnologia Aeroespacial da China (CASC, na sigla em inglês), é um dos mais complexos sistemas de veículos espaciais que a China já desenvolveu. É formado por um orbitador, um módulo de retorno, um módulo de pouso e um ascensor, e conta com 15 subsistemas. Entre os feitos mais impressionantes cumpridos
por essa missão está a coleta de amostras da Lua e seu acondicionamento em um contêiner a vácuo. A Academia Chinesa de Tecnologia Espacial (CAST, na sigla em inglês), uma subsidiária da CASC, é responsável pela pesquisa e desenvolvimento das tecnologias essenciais da sonda. Os projetistas criaram ferramentas para recolher amostras da superfície lunar, com brocas para escavar amostras e garras para recolhê-las. Com todo esse equipamento avançado, a sonda coletou cerca de 2 kg de solo lunar por meio de perfuração profunda, perfuração rasa e procedimentos de revolver, cavar e recolher, entre outros métodos. As amostras foram seladas em um contêiner a vácuo.
Especialistas da CAST dizem que os recursos de coleta de amostras da Chang’e-5 constituem uma espécie totalmente nova de tecnologia. Todos os aspectos, desde a missão de voo até medição e controle, condições de iluminação, suprimento de energia e controle térmico da sonda, foram levados em consideração. Além disso, enquanto coletava amostras, a sonda superou desafios, como as altas temperaturas na superfície lunar, o tempo restrito de operação e os complexos procedimentos exigidos.
Decolagem e ascensão – Após concluir a missão de dois dias na superfície da Lua, a Chang’e-5 voltou para casa, um desafio que resultou em outro feito pioneiro na história espacial da China — uma decolagem e ascensão lunar.
Não há na superfície da Lua um local de lançamento adequado, e menos ainda algo que possa fazer as vezes de uma torre de lançamento. O ascensor só poderia ser lançado do próprio módulo de pouso e, se este viesse a pousar em alguma porção desfavorável do terreno, a decolagem se tornaria mais difícil. Além disso, o processo todo de decolagem dependia unicamente do veículo espacial.
Diante de tais dificuldades técnicas, especialistas da CAST realizaram numerosos testes de campo. A simulação do ambiente da superfície lunar, com sua baixa gravidade e alto nível de vácuo, tampouco facilitava a tarefa. Após uma série de inovações tecnológicas, uma equipe de pesquisa da CAST conseguiu realizar vários testes e criar um conjunto de sistemas interligados para dar apoio ao retorno da Chang’e-5 a partir da Lua.
Encontro e acoplamento – Depois de decolar da superfície lunar, o ascensor da Chang’e-5 ingressou na órbita lunar, mas eram necessárias etapas adicionais para enviar amostras lunares de volta à Terra. Ainda na órbita lunar, ele também precisava realizar o encontro e acoplamento com a combinação orbitador-módulo de retorno e entregar as amostras ao módulo para o resto da viagem.
Embora várias naves espaciais tripuladas da China já tivessem realizado essas operações de encontro e acoplamento na órbita baixa da Terra, um encontro não tripulado em órbita lunar, a cerca de 380 mil km da Terra, constitui desafio consideravelmente maior.
O orbitador-módulo de retorno foi aos poucos se aproximando do ascensor por meio de controle de longa distância e controle autônomo de curta distância, e capturou então o ascensor com garras de preensão. O processo não pôde contar com sinais de navegação por satélite, por isso precisava ser altamente automatizado e superar várias limitações, cuidando da detecção e controle da sonda, das condições de iluminação, do sistema de atitude e controle de órbita (Attitude and Orbit Control System, AOCS), do suprimento de energia e do controle
térmico. O dispositivo de alta precisão para realizar a transferência das amostras constituiu um desafio adicional que precisava ser resolvido.
Os projetistas fizeram um cuidadoso planejamento de uma série de ações, desde a entrada do ascensor em órbita lunar até a completa transferência das amostras, para permitir o encontro, acoplamento e a operação de combinação e separação, de modo que a Chang’e-5 concluísse com precisão a transferência das amostras.
Amostras em alta velocidade – Normalmente, as naves espaciais na órbita baixa da Terra viajam à primeira velocidade cósmica, de cerca de 7,9 km por segundo, quando fazem sua reentrada na atmosfera. Mas a Chang’e-5 movia-se em direção à Terra à segunda velocidade cósmica, de 11,2 km por segundo. Essa diferença de velocidade de mais de 3 km por segundo faz uma imensa diferença em termos de dinâmica. Havia o risco de que a Chang’e-5 avançasse rápido demais e se espatifasse contra a Terra, com o fracasso da missão.
Para resolver potenciais problemas, os pesquisadores propuseram um método pioneiro de salto semibalístico. O módulo de retorno primeiro entra na atmosfera a alta velocidade, ricocheteia com o impulso do choque com a atmosfera e entra em seguida de novo na atmosfera, voltando à Terra na primeira e desejada velocidade cósmica.
Em 2014, a China lançou o veículo de teste de voo da Chang’e-5 para reentrada e retorno, que simulava o processo todo, desde o voo da Chang’e-5 até a Lua, a órbita em volta dela e o retorno à Terra. O método proposto pelos pesquisadores mostrou-se bem-sucedido. A China se tornou o terceiro país do mundo capaz de trazer de volta uma nave espacial da órbita lunar para a Terra, depois dos Estados Unidos e da antiga União Soviética.
Mas houve pequenas diferenças entre o experimento e a missão. O veículo de reentrada e retorno da Chang’e-5 usou um modelo anterior do teste de voo, explicaram os especialistas. Como não se sabia ao certo o peso que teria o contêiner de amostras, isso poderia afetar o desempenho do módulo de retorno e fazer exigências maiores ao controle de percurso, à navegação e ao sistema de controle geral do módulo de retorno.
Pei Zhaoyu, vice-diretor do Centro de Exploração Lunar e Programa Espacial da Administração Nacional do Espaço da China (CNSA, na sigla em inglês), disse que o lançamento da Chang’e-5 significa que a China realizou pela primeira vez uma operação completa de coleta de amostras lunares, análise e processo de pesquisa.
Explorar o desconhecido – Desde que a missão de lançamento foi aprovada, a equipe inteira da missão Chang’e-5 dedicou dez anos de trabalho duro até o lançamento da sonda. Com total dedicação e grande entusiasmo, por meio de tentativa e erro, superaram todos os desafios da tecnologia de base e realizaram sua missão.
A decolagem lunar, o encontro e acoplamento orbital, a reentrada e o retorno realizados pela missão Chang’e-5 plantaram os alicerces de futuras missões tripuladas, declarou Wu Yanhua, vice-administrador da CNSA e vice-comandante do programa de exploração lunar, em coletiva de imprensa realizada pelo Escritório de Informações do Departamento de Estado. “O objetivo do programa chinês de pouso lunar tripulado é realizar pesquisa científica e explorar o desconhecido”, disse Wu.
Segundo ele, já foi iniciada a primeira missão do programa de exploração planetária da China, que é a missão a Marte –Tianwen-1. Um trio de naves espaciais, formado por um orbitador, um módulo de pouso e um veículo explorador, foi lançado com sucesso de Wenchang, em 23 de julho de 2020, em direção a Marte. A sonda Tianwen-1 entrou em órbita de Marte em 10 de fevereiro de 2021. Ela voou 475 milhões de km e estava a 192 milhões de km da Terra quando alcançou a órbita do planeta. É a primeira vez que uma nave espacial chinesa
orbita um planeta extraterrestre.
Além desta, estão planejadas missões de exploração e coleta de amostras de asteroides, outra para trazer amostras de Marte e uma missão transplanetária e de órbita de Júpiter.
Quanto à exploração interplanetária futura, Wu explicou que o primeiro objetivo é fazer um levantamento da Lua e de outros planetas, incluindo o ambiente espacial, o ambiente geológico e todo tipo de radiação que possa constituir uma preocupação para os humanos. O segundo objetivo é construir uma infraestrutura. O satélite Te Queqiao, como parte da missão Chang’e-4, pode prover comunicação ininterrupta entre a Terra e a Lua. Será construída também uma infraestrutura permanente para suprimento de água e energia.
O propósito da “utilização” está relacionado primordialmente com a possibilidade de os seres humanos utilizarem e desenvolverem recursos extraterrestres. “Esse é um dos propósitos principais das atividades de exploração interplanetária ao redor do mundo”, declarou Wu.
De acordo com o plano de três etapas do programa espacial tripulado da China, os anos de 2021 e 2022 serão muito movimentados. Wu disse que a China planejou 11 missões de lançamento para esse período. Serão lançados até a estação espacial chinesa especificamente um módulo-base de estação espacial, dois módulos de teste, quatro espaçonaves de carga e quatro veículos espaciais tripulados. Isso permitirá realizar vários experimentos científicos em órbita.
Segundo Wu, o desenvolvimento do setor espacial tem como fator determinante os veículos de lançamento. Após os lançamentos consecutivos bem-sucedidos dos foguetes existentes, especialmente os Longa Marcha-5, a China irá aprimorar seu novo sistema de veículos de lançamento não tóxicos e livres de poluição para atender às futuras missões espaciais.