Entre janeiro e agosto de 2024, o Brasil alcançou um valor recorde de exportações. As vendas para o exterior ultrapassaram R$ 1,2 trilhão. Analistas explicam como esses números refletem no cenário econômico brasileiro.
Dados divulgados nesta semana pela Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Secex/MDIC) apontam que as exportações brasileiras bateram recorde no acumulado de janeiro a agosto, chegando a US$ 227 bilhões (cerca de R$ 1,2 trilhão), um aumento de 1,1% em relação ao mesmo período do ano passado.
Em paralelo, as importações no período somaram US$ 173 bilhões (cerca de R$ 965 bilhões), uma alta de 6,6% em relação ao ano passado. Com o valor, a corrente de comércio — que reflete a soma das importações e exportações brasileiras — ficou em US$ 400 bilhões (aproximadamente R$ 2,2 trilhões), com superávit da balança comercial de US$ 54,08 bilhões (quase R$ 302 bilhões).
No recorte entre setores, os dados apontam que em agosto houve redução de US$ 1,46 bilhão (cerca de R$ 8,1 bilhões) nas exportações de agropecuária e indústria extrativa e de US$ 0,58 bilhão (cerca de R$ 3,2 bilhões) no setor de indústria extrativa. Já as exportações de produtos da indústria de transformação registraram aumento de US$ 0,1 bilhão (cerca de R$ 0,56 bilhão).
Em entrevista à Sputnik Brasil, especialistas analisam o que os dados refletem sobre a situação atual da economia brasileira.
Maria Beatriz de Albuquerque David, economista e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), aponta que entre os fatores que levaram ao recorde de exportações estão a desvalorização do real e o aumento das exportações de produtos processados.
“Há ainda redução no preço das matérias-primas, tanto agropecuária como extrativas, além da queda dos quantitativos exportados”, afirma.
Enquanto o cenário de janeiro a agosto deste ano é de alta e recordes batidos, o recorte sinalizado entre os meses de julho e agosto são diferentes. Segundo Juliana Inhasz, professora e coordenadora do curso de graduação em economia do Insper, é preciso olhar para esses dois cenários.
Se nos primeiros oito meses, conforme aponta a especialista, tivemos desvalorização do preço dos produtos, somado a uma taxa de câmbio mais alta, favorecendo a exportação, o saldo ruim dos dois meses que antecederam setembro mostra a redução no volume de mercadorias embarcadas.
“Isso significa que a gente está vendendo menos para fora; sinal e reflexo de muita coisa, desde o fato de que o produto brasileiro está concorrendo com outros produtos. As estiagens aqui contribuem negativamente para a qualidade do produto, especialmente do agro”, explica Inhasz.
Em relação à redução de exportações no setor agropecuário e ao aumento na indústria de transformação, a professora do Insper explica as diferentes valorizações atreladas às categorias.
Os produtos agrícolas, segundo Inhasz, sofreram desvalorização no mercado internacional, ou seja, as mercadorias ficaram mais baratas.
“A gente está recebendo menos por elas, então isso deve explicar a maior parte dessa queda adicional à redução do volume, que foi um dos dados mensurados especificamente para o mês de agosto”, comenta.
Quanto ao aumento dos produtos que competem à indústria de transformação, a especialista deriva do aumento da taxa de câmbio, embora a alta seja discreta.
“A indústria de transformação não passa pelo mesmo processo hoje, de desvalorização dos produtos, como é o caso do agro, porque a indústria de transformação não é cotação internacional, não é commodity, então o que acontece é que provavelmente o valor está um pouco maior porque a taxa de câmbio está alta”, compara.
Negócios internacionais em alta: como esses números refletem na economia brasileira?
Apesar da alta significativa em uma série histórica, os números não representam “um superprotagonismo da economia brasileira”, explica Inhasz.
O que está acontecendo, segundo ela, pode ser visto da seguinte forma: “Há uma dependência grande do setor externo, o aumento da taxa de câmbio torna nossas exportações mais vantajosas, mas, ao mesmo tempo, também torna as importações mais caras. Como o Brasil, ele tem baixa capacidade de substituição de uma parte significativa dos produtos que importa. O que acontece no final do dia é que a gente acaba tendo que amargar preços maiores.”
As importações em alta nesse cenário apontam que o Brasil arca com um custo maior para ter as mercadorias, enquanto mostra que mal consegue criar alternativas para substituir ou deixar de comprar, enquanto as exportações também crescem, “mas em ritmo discreto”, ressalta a professora do Insper.
De acordo com Inhasz, no acumulado do ano, a crescente pode ser significativa, representar quebra de recordes, o que é efeito inclusive “de uma recuperação econômica”. Entretanto, a balança comercial continua discreta, “sinalizando essa grande dependência que o Brasil tem dos produtos que a gente compra fora dessas importações”.
Embora a notícia sobre o aumento das exportações brasileiras venha no mesmo dia que o mercado elevou de 2,46% para 2,68% a projeção da expansão do produto interno bruto (PIB) este ano, a analista não sinaliza que as exportações brasileiras neste momento levarão a esse crescimento econômico.
“Esse valor não é impulsionado tão fortemente pelas exportações, porque como a gente viu no saldo entre exportações e importações, o resultado que a gente está tirando ainda é bem pequeno”, finaliza.