Biocombustíveis não têm como frear crise, mas ajudam na transição energética do Brasil, diz analista

Apesar das recentes quedas, os preços dos combustíveis continuam sendo um fator de instabilidade no Brasil e a busca por soluções segue em andamento. A Sputnik Brasil ouviu uma pesquisadora do setor de energia para entender como a produção de biocombustíveis pode influenciar esse cenário.

O Brasil é considerado uma referência mundial quando o assunto são os biocombustíveis. Entre os principais biocombustíveis utilizados no país estão hoje o etanol, o biodiesel e o biometano. Esses combustíveis são fabricados a partir de culturas vegetais — como a cana-de-açúcar, o milho e a mamona — e de resíduos que seriam desperdiçados — como a gordura animal e o processo de biodigestão de matéria orgânica.

Devido à forma como são produzidos, os biocombustíveis são considerados mais ecológicos por apresentarem uma redução das emissões de gases estufa em relação aos combustíveis de origem fóssil.

Para a engenheira química Nathalia Diaz, pesquisadora em Energias Renováveis no Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) e ligada à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), apesar das vantagens dos biocombustíveis e da liderança brasileira no setor, ainda não há um quadro de produção nacional capaz de influenciar os preços de forma significativa.

“Fazendo uma análise para o curto prazo, os biocombustíveis não têm força para frear a crise dos combustíveis. Isso porque, além do problema de falta de oferta, há desafios técnicos que devem ser supridos para dar conta da demanda de combustível ao nível nacional”, afirma a pesquisadora à Sputnik Brasil.

Instalações da Refinaria de Paulínia (Replan), da Petrobras, em São Paulo, Brasil, 3 de maio de 2022. Foto: Folhapress

Segundo Diaz, no curto prazo, as opções dos governos mundo afora para controlar a escalada de preços tem sido a redução dos impostos que incidem sobre os combustíveis. Além do Brasil, cujo preço nas bombas tem influência direta da política de preços da Petrobras, isso também ocorreu nos Estados Unidos do democrata Joe Biden, por exemplo.

A pesquisadora do Ineep ressalta que a produção de gasolina no Brasil ainda é cerca de quatro vezes maior que a de etanol, sendo que a mistura da gasolina brasileira tem apenas 30% de etanol na sua composição. Isso mostra que ainda há grande dependência da produção de combustível fóssil no país.

Apesar da ligação com a expansão agrícola, a pesquisadora Nathalia Diaz salienta a necessidade de investir na produção de biocombustíveis no longo prazo como uma forma de perseguir metas de sustentabilidade e reduzir a dependência de combustíveis fósseis.

“[Investir na produção de biocombustíveis é necessário] principalmente para que o Brasil consiga alcançar melhores resultados em termos de transição da matriz energética, diminuir a dependência dos combustíveis fósseis e, além disso, contribuir com a estabilização das condições climáticas ao nível de emissões de carbono, por exemplo”, afirma.

Logo da Petrobras em Cabo Frio, Rio de Janeiro, 26 de setembro de 2012. Foto: Folhapress.

Mudanças na Petrobras afetam produção de biocombustíveis

Desde o fim do governo da presidente Dilma Rousseff (PT), em 2015, a Petrobras passou por uma série de mudanças que, entre outras coisas, geraram a venda de ativos como refinarias e de empresas como a BR Distribuidora. Além disso, a estatal adotou uma nova política de preços de combustíveis atrelando os preços no Brasil ao mercado internacional.

Segundo a pesquisadora Nathalia Diaz, também houve mudanças na Petrobras que impactam a produção de biocombustíveis no Brasil. É o caso da desativação das usinas da Petrobras Biocombustível (PBio), o que, segundo Diaz, gerou impacto na agricultura familiar e em grupos de baixa renda.

“Desde o início da sua construção, a PBio, alinhada ao Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB), foi um programa para a produção de oleaginosas pela agricultura familiar para ser usada como matéria-prima no processo de produção do biodiesel”, explica Diaz, detalhando a relação dos biocombustíveis com agricultores familiares.

Caminhões-tanque são carregados com combustíveis em distribuidora de São Paulo, Brasil, 10 de abril de 2019. Foto: Folhapress.

Segundo a pesquisadora, o PNPB atendia principalmente as regiões do semiárido e sul. O programa, criado em 2005, é um dos principais motores do uso dos biocombustíveis no Brasil, a exemplo do Programa Nacional do Álcool (ProAlcool), da década de 1970, e da adoção da tecnologia flex fuel no Brasil, em 2003. Conforme Diaz, entre 2009 e 2012, mais de 65 mil agricultores familiares faziam parte do PNPB.

“Algumas políticas públicas foram estabelecidas em direção à inclusão social por meio da geração de empregos, além de ser uma oportunidade de ampliar as fontes de energias renováveis. [À época] o governo federal criou, inclusive, o Selo de Combustível Social (SCS) a fim de integrar a agricultura familiar à cadeia produtiva do biodiesel”, ressalta a pesquisadora, salientando a importância social do programa ligado aos biocombustíveis.

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