China se posiciona ao lado do Brasil em guerra tarifária com os EUA

Alinhamento diplomático e comercial entre Brasil e China ganha força após sobretaxas impostas por Trump; Pequim se mostra aliada estratégica em meio à tensão global

(Foto: Reprodução)

Em meio à nova ofensiva tarifária liderada pelos Estados Unidos, o Brasil encontrou um apoio firme no seu principal parceiro comercial: a China. O chanceler chinês Wang Yi declarou solidariedade ao governo brasileiro diante do tarifaço anunciado por Donald Trump e reiterou que Pequim se opõe à “intimidação tarifária” e à “interferência externa irracional” nos assuntos internos do Brasil.

A manifestação pública foi feita durante conversa telefônica entre Wang Yi e Celso Amorim, assessor especial da Presidência brasileira. O gesto não é apenas simbólico: enquanto os EUA impõem barreiras, a China amplia o espaço para produtos brasileiros — como a recente autorização para que 183 empresas exportem café ao país asiático, medida que entra em vigor justamente na mesma semana em que as tarifas norte-americanas começam a valer.

Para muitos analistas, o apoio chinês reforça o papel estratégico da parceria Brasil-China num momento em que a ordem global do comércio está sendo pressionada por decisões unilaterais de Washington.

O tarifaço e a reação de Pequim

No início de julho, Trump impôs uma tarifa extra de 50% sobre diversos produtos brasileiros — o maior percentual já aplicado pelo governo norte-americano a um único país. A medida, segundo observadores, tem caráter mais político do que comercial, e foi interpretada como uma tentativa de pressionar o Supremo Tribunal Federal brasileiro no julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, aliado declarado de Trump e réu por tentativa de golpe de Estado.

A China respondeu prontamente. Já em julho, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês, Mao Ning, criticou duramente o uso de tarifas como “ferramentas de coerção, intimidação ou interferência”. A diplomacia chinesa reforçou o compromisso com os princípios da soberania e da não intervenção, pilares da Carta da ONU, e alertou para os riscos de desestabilização da ordem comercial internacional.

Wang Yi foi além e afirmou que as ações dos EUA “minam a estrutura do comércio global” e atingem especialmente países em desenvolvimento — como o Brasil — que dependem do acesso a grandes mercados.

Comércio bilateral e dependência estratégica

A China é, de longe, o maior parceiro comercial do Brasil. Em 2024, a balança comercial entre os dois países ultrapassou US$ 100 bilhões, com destaque para as exportações brasileiras de soja, minério de ferro e carne. O país asiático responde hoje por cerca de um terço de tudo que o Brasil vende ao exterior.

Em contrapartida, os EUA registram superávit comercial em relação ao Brasil, o que torna ainda mais questionável a justificativa econômica para o tarifaço de Trump. Na prática, a medida afeta diretamente exportadores brasileiros e amplia a dependência de mercados como o chinês — uma faca de dois gumes.

Ao anunciar o novo credenciamento de empresas brasileiras para exportação de café, a China deu um sinal claro de que está disposta a ocupar o vácuo deixado pelos Estados Unidos. Em comunicado nas redes sociais, a Embaixada da China no Brasil declarou: “A união faz a força”, reforçando a imagem de parceria solidária diante da turbulência geopolítica.

Brasil entre dois gigantes

A postura da China frente à crise tarifária também revela seu interesse estratégico em consolidar influência sobre o Brasil, especialmente em um cenário de disputas crescentes com os EUA. Desde o início do ano, Pequim também tem enfrentado barreiras comerciais impostas por Trump, o que levou a uma escalada de retaliações que impactou diversos setores — de semicondutores a produtos agrícolas.

Ao estender a mão ao Brasil, a China sinaliza que pretende fortalecer uma frente multilateral contra ações unilaterais norte-americanas. Para o governo Lula, essa aliança pode representar não apenas alívio econômico, mas também respaldo político em arenas como a OMC e o BRICS.

No entanto, especialistas alertam para os riscos de excessiva dependência. “O Brasil precisa diversificar seus mercados e manter autonomia estratégica. A China é um parceiro essencial, mas isso não pode significar substituição de uma dependência por outra”, avalia a economista internacionalista Luciana Ferraz, da USP.

E agora? O que esperar da parceria sino-brasileira

O atual momento pode redefinir os rumos da política comercial brasileira. Com as portas dos EUA parcialmente fechadas, e a China estendendo tapete vermelho, o governo brasileiro se vê diante de uma escolha complexa: dobrar a aposta na parceria com o gigante asiático ou buscar uma reconfiguração mais ampla da sua política externa e comercial.

Enquanto isso, os efeitos da guerra tarifária já são sentidos no campo e nas indústrias exportadoras. A liberação para exportação de café à China é bem-vinda, mas limitada. Há expectativa de que novos setores — como carnes e frutas — também sejam incluídos em acordos facilitados com Pequim.

O governo Lula já anunciou que levará o caso à OMC, mas sabe que o caminho será longo. Até lá, o Brasil depende de aliados que ofereçam não apenas apoio retórico, mas também acesso real a mercados e investimentos.

A pergunta que fica é: em tempos de alianças fluidas e pressões cruzadas, a China será mesmo a melhor amiga do Brasil? Ou apenas uma parceira estratégica — enquanto os ventos sopram a favor?

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