Brasil reage ao “tarifaço” de Trump com reforço dos laços com a China e o BRICS

Enquanto Washington impõe barreiras e pressiona por interesses políticos, Brasil aposta em soberania digital, multipolaridade e alianças estratégicas com o Sul Global

(Foto: Reprodução / Getty Images)

O cenário diplomático entre Brasil e Estados Unidos vive seu momento mais tenso em anos. Com o anúncio de tarifas de 50% sobre exportações brasileiras aos EUA e críticas diretas ao sistema de pagamentos Pix, o governo norte-americano, liderado por Donald Trump, reacendeu disputas econômicas e políticas que extrapolam a balança comercial. Em resposta, o Brasil não apenas condenou a postura agressiva da Casa Branca, como também dobrou sua aposta nas alianças com a China e os países do BRICS — um movimento que marca um novo capítulo na inserção internacional do país.

A reação mais clara veio do assessor especial da Presidência para assuntos internacionais, Celso Amorim, em entrevista ao Financial Times. Segundo ele, os ataques de Trump estão “reforçando nossas relações com os BRICS”, já que o Brasil busca “relações diversificadas, sem depender de nenhum país”. A fala ecoa uma estratégia diplomática de médio e longo prazo: apostar na multipolaridade e no fortalecimento das pontes com o Sul Global, em especial com a China — o maior parceiro comercial do Brasil desde 2009.

Nos últimos dias, a China se manifestou oficialmente em apoio ao Brasil, defendendo o multilateralismo, a justiça econômica e a autonomia digital. Em tom direto, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores de Pequim afirmou que o país está pronto para “trabalhar lado a lado com o Brasil” para promover uma ordem econômica global mais equitativa e combater o protecionismo.

O pano de fundo desse impasse vai além das tarifas. Trump tem vinculado sua retaliação econômica ao tratamento dado pelo Judiciário brasileiro ao ex-presidente Jair Bolsonaro, seu aliado político, acusado de tentar um golpe de Estado. O republicano classificou as ações da Justiça brasileira como “perseguição” e acusou Lula de “chantagem”. O presidente brasileiro reagiu: “Bolsonaro não é problema meu, é da Justiça brasileira. Se Trump tivesse me ligado, eu explicaria”.

Além do embate jurídico-político, o alvo da vez foi o Pix, sistema de pagamentos criado pelo Banco Central, que se tornou uma referência mundial em inclusão financeira e inovação digital. Usado por mais de 76% da população brasileira e responsável por mais de R$ 26 trilhões em movimentações em 2024, o Pix desbancou os cartões tradicionais — o que, segundo analistas, gerou incômodo em empresas como Visa, Mastercard e Meta, tradicionais dominantes do setor nos EUA.

A ofensiva norte-americana é vista por especialistas como uma tentativa de preservar seus interesses comerciais frente ao avanço de soluções autônomas e soberanas, como o Pix. Em paralelo, a China observa com atenção — e interesse. Líder em pagamentos digitais com plataformas como Alipay e WeChat Pay, o país asiático compartilha da visão de que a próxima disputa estratégica global está na tecnologia financeira e na soberania digital.

Nos bastidores dos BRICS, já se discute a criação de plataformas financeiras comuns, que reduzam a dependência do dólar e incentivem o uso de moedas locais nas transações entre os países-membros. O Brasil, que preside o bloco em 2025, tem usado o tema da “desdolarização” como bandeira diplomática, o que desagradou Washington, mas agradou parceiros como China, Índia e Rússia.

Apesar da pressão, Amorim afirma que o BRICS não é um grupo ideológico, mas sim um instrumento de equilíbrio internacional. “Queremos reforçar os BRICS e também os laços com Europa, América do Sul e Ásia. Não se trata de substituir um parceiro por outro, e sim de não depender de apenas um”, afirmou.

Ainda assim, dentro do Brasil, as reações à postura do governo variam. Enquanto governadores aliados ao Planalto defendem a diversificação das relações e criticam o “intervencionismo norte-americano”, opositores como Ratinho Jr. e Tarcísio de Freitas criticaram publicamente a estratégia, considerando as falas de Lula sobre desdolarização “imprudentes”.

Independentemente das críticas, o movimento brasileiro parece cada vez mais claro: responder à pressão com autonomia, ampliar parcerias com países que respeitem sua soberania e encontrar caminhos para uma inserção global mais plural e estratégica. Com a China ao lado — e os BRICS em crescimento — o Brasil sinaliza que não pretende se curvar às ameaças unilaterais.

Num mundo em transformação, em que os centros de poder se deslocam e novas alianças se formam, o Brasil aposta em soberania, diplomacia ativa e inovação como seus trunfos. Se conseguirá manter esse equilíbrio entre gigantes, ainda não se sabe — mas, ao que tudo indica, o país está disposto a jogar com autonomia e inteligência.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui