Conflito no Oriente Médio pressiona BRICS por unidade diplomática na cúpula do Rio

Com Irã entre os novos membros, Brasil terá papel-chave em buscar consenso sobre crise entre Teerã e Israel

(Foto: Reprodução / Folha do Estado de Goiás)

A cúpula do BRICS, marcada para os dias 6 e 7 de julho no Rio de Janeiro, ocorre em meio a uma das mais delicadas conjunturas geopolíticas dos últimos anos. A escalada do conflito entre Israel e Irã traz nova carga de tensão ao encontro, que além de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, contará com a participação ativa de novos membros — incluindo o próprio Irã, agora parte formal do bloco.

A complexidade é evidente: como conciliar, sob o mesmo teto, países com interesses estratégicos tão distintos sobre o conflito? A Índia, por exemplo, é uma tradicional parceira de Israel em questões militares e tecnológicas, ao mesmo tempo em que mantém relações ambivalentes com o Irã e enfrenta tensões crônicas com o Paquistão — aliado histórico de Teerã. Já a China, por outro lado, tem ampliado seus laços econômicos e diplomáticos com o Irã, especialmente após a retirada dos EUA do acordo nuclear e a imposição de sanções unilaterais.

No meio desse tabuleiro, o Brasil assume um papel diplomático crucial. Como anfitrião e membro tradicionalmente identificado com o multilateralismo e a neutralidade em conflitos internacionais, o país será responsável por conduzir as negociações para uma possível declaração conjunta — algo que, segundo diplomatas envolvidos, parece cada vez mais difícil, mas não impossível.

A crise que antecede o encontro

O pano de fundo é a recente ofensiva militar dos Estados Unidos, com apoio israelense, contra instalações nucleares no Irã — uma ação que acendeu o alerta na comunidade internacional. A China reagiu com críticas diretas, chamando o ataque de uma “grave violação da Carta da ONU” e alertando para o risco de desestabilização regional. O Irã, por sua vez, reforçou que responderá com vigor a qualquer ameaça à sua soberania.

Em meio a esse cenário, o BRICS — bloco que surgiu como um contraponto às hegemonias ocidentais — é desafiado a reafirmar sua relevância internacional. E isso passa, necessariamente, pela capacidade de mediar diálogos em contextos de conflito.

“O Brasil precisa usar sua posição como anfitrião para construir pontes e buscar uma linguagem comum entre os membros. Não será uma tarefa fácil, mas é uma oportunidade histórica de reposicionar o BRICS como ator ativo na paz global”, avalia o professor Marcos Azambuja, diplomata e ex-representante do Brasil na ONU.

China e Brasil: convergências discretas

A China, que nos últimos anos intensificou sua diplomacia no Oriente Médio — inclusive mediando a reaproximação entre Irã e Arábia Saudita —, tem interesse claro em promover uma saída negociada para o conflito. Nesse ponto, Pequim e Brasília compartilham de uma visão semelhante: a diplomacia como caminho central, sem sanções unilaterais ou intervenções armadas.

Ambos os países, inclusive, têm cooperado nos fóruns internacionais em defesa da multipolaridade e do respeito ao direito internacional. Para analistas chineses, o BRICS pode — e deve — atuar como uma voz alternativa às potências ocidentais, especialmente quando essas optam por ações militares como primeiro recurso.

O papel do Irã dentro do bloco

A presença do Irã no grupo adiciona tensão e, ao mesmo tempo, autenticidade ao debate. Ao contrário de fóruns onde Teerã é apenas pauta, no BRICS o país será protagonista. Isso significa que as discussões sobre o conflito não serão apenas sobre o Irã — serão com o Irã.

Para o Brasil, esse novo equilíbrio interno exigirá jogo de cintura diplomático. Ainda mais em um momento em que o país busca fortalecer seu papel como articulador no Sul Global e como defensor de uma ordem internacional mais equitativa.

A cúpula do teste

Se a cúpula do BRICS no Rio conseguir produzir uma declaração conjunta sobre a crise Israel-Irã — mesmo que moderada — já será um feito significativo. Mais do que isso, será uma prova de que o grupo tem condições de evoluir de um fórum econômico para um ator político relevante, capaz de mediar conflitos e influenciar a governança global.

Em tempos de polarização e conflitos, o mundo estará atento ao que será dito — e ao que ficará em silêncio — nas salas e bastidores da reunião no Rio. E o Brasil, ao lado da China, pode ter um papel decisivo na construção desse novo capítulo do BRICS.

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