TikTok passa o Google e mostra que a China tem ginga

Os chineses conseguiram –e mostraram que têm ginga, criatividade, uma qualidade que não costuma ser associada à China. O TikTok destronou o Google como o destino mais visitado na internet em 2021, segundo dados da ferramenta Cloudfare Radar, que monitora tráfego de dados na internet.

Da 7ª posição em 2020, o TikTok acabou o ano passado em 1º lugar. É uma notícia e tanto porque aponta que a China não vai ficar sentada quietinha no canto que o Ocidente havia reservado para o país –o de fábrica do mundo.

A expansão vertiginosa do TikTok mostra que os chineses entenderam rapidinho como funciona o universo das redes sociais, dos algoritmos viciantes e do humor. Afinal, o TikTok parece funcionar como um descompressor da pandemia. Quanto pior a situação, mais sucesso as suas brincadeirinhas vão fazer. Nada disso é obra do acaso.

O TikTok foi lançado mundialmente pela companhia chinesa ByteDance em 2017, mas só teve o efeito devastador sobre os usuários 1 ano depois. O aplicativo é uma mistura de ideias próprias da ByteDance com outras duas empresas que foram compradas: a Musical.ly (por US$ 1 bilhão) e a Flipagram.

A Musical.ly já tinha algo de TikTok: o aplicativo permitia que o usuário dublasse músicas de sucesso a partir de um cenário pronto –um dos ovos de Colombo do do TikTok, o de facilitar ao máximo a vida do usuário, foi herança da Musical.ly. E oferecia centenas de filtros para tratar os vídeos caseiros.

A ByteDance é um daqueles casos de sucesso chinês de deixar o Ocidente assustado: tinha 1,9 bilhão de usuários ativos mensalmente no meio do ano passado; o Facebook tinha 2,9 bilhões no 3º trimestre de 2021, o último dado disponível.

O ex-presidente dos EUA Donald Trump tentou impedir o TikTok de atuar nos Estados Unidos por acreditar que a ByteDance tinha uma parceria com o governo chinês e com Partido Comunista de lá. Era mentira na época em que Trump tentou expulsar o TikTok dos EUA. Por ironia da história, o governo chinês detém agora 1% do TikTok. A aliança da ByteDance com o Partido Comunista Chinês começou em 2019, quando a companhia criou uma joint venture com o jornal Beijing Times. A publicação pertence ao diretório municipal do PCC.

Fiz esse histórico da ligação da ByteDance com o Partido Comunista Chinês para mostrar como a organização mudou nos últimos 50 anos. Não há no PCC uma atração fatídica para os mitos da esquerda ocidental, sobretudo a ideia de controle estatal das empresas; o entulho do passado que teima em permanecer é a repulsa à democracia e o medo do debate, o que resulta em censura ferrenha.

O mais engraçado de tudo é que quase todos os especialistas dizem explicar facilmente a razão de sucesso do TikTok. Primeiro ingrediente: é uma combinação 2 aplicativos que eram megapopulares, o Instagram e o Snapchat. O principal conteúdo do TikTok é um velho companheiro de crianças e adolescentes: música e humor. O que parece fazer toda a diferença é o algoritmo. Como todo algoritmo de rede social, ele resulta numa relação viciante com o aplicativo, como mostra um documento interno do TikTok revelado em dezembro pelo colunista de mídia do jornal The New York Times.

Viciante, aqui, não é uma metáfora. É o que ocorre de fato. O segredo dessa relação é a capacidade que o algoritmo tem de extrair informações sobre você no menor tempo possível.

Batizado “TikTok Algo 101”, o documento sobre a rede de compartilhamento de vídeos parece uma coleção de obviedades, do tipo “o que vale é manter o usuário ligado a maior parte do tempo”. Todas as redes sociais tentam fazer isso, mas o TikTok o faz com uma eficiência para seus negócios que parece explicar a ascensão meteórica do aplicativo.

NY Times ouviu um especialista em algoritmos, Guillaume Chaslot, criador da ONG da Algo Transparency. Segundo ele, o sistema do TikTok trabalha com o tempo que o usuário gasta no aplicativo, dando a ela a falsa impressão de livre escolha: “O algoritmo busca viciar as pessoas em vez de dar a elas o que elas realmente querem”.

Uma coisa parece certa: os chineses do TikTok aprenderam esses truques sujos com os americanos. Um dos engenheiros que assina o documento revelado pelo The New York Times estudou na Universidade Columbia e trabalhou no Facebook, segundo a página do profissional chinês no Linkedin. Uma jornalista americana, Amalie MacGowan, escreveu um texto que prova o grau de acuidade do algoritimo do TikTok. O título explica tudo: “O TikTok conhece minha sexualidade melhor do que eu”.

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