A mais recente investida do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra o BRICS acendeu mais uma vez o alerta em Brasília e Pequim. Durante um pronunciamento na última semana, Trump anunciou a imposição de uma tarifa adicional de 10% sobre todos os países-membros do BRICS e nações alinhadas ao grupo, alegando que o bloco formado por economias emergentes estaria promovendo ações para enfraquecer o dólar e ameaçar os interesses norte-americanos.
“Se eles quiserem jogar esse jogo, tudo bem. Mas eu também posso jogar”, afirmou Trump em tom desafiante, marcando um endurecimento inédito em relação ao BRICS como conjunto, e não apenas a países isolados como China ou Rússia.
O bloco, que inicialmente reunia apenas Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, ampliou sua composição a partir de 2023, incorporando países como Egito, Irã, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Indonésia. Outros, como Nigéria, Belarus, Bolívia, Cuba e Uzbequistão, atuam como observadores e parceiros estratégicos.
Por que o BRICS incomoda Washington
Segundo analistas ouvidos pela Agência Brasil China, a preocupação dos EUA está menos ligada a medidas concretas — já que o BRICS não possui até agora um mecanismo financeiro unificado — e mais ao simbolismo político da articulação. O bloco tem defendido uma nova governança global, com ênfase em um sistema financeiro menos dependente do dólar e mais aberto a moedas locais, incluindo o yuan chinês e, em menor escala, o real brasileiro.
“O BRICS ganhou volume político com essa expansão. Os discursos por multipolaridade e por uma reforma no sistema financeiro internacional, mesmo que ainda estejam no campo das ideias, são lidos como ameaça real pelos EUA”, explica Felipe Loureiro, professor de Relações Internacionais da USP.
Essa leitura ficou evidente na sequência de anúncios feitos por Trump após a cúpula do BRICS no Rio de Janeiro, no início de julho. Primeiro vieram as tarifas de 50% sobre produtos brasileiros, focando aço, petróleo e aeronaves. Agora, o novo pacote mira o grupo como um todo.
Impactos para o Brasil
Para o Brasil, a situação gera um duplo desafio: ao mesmo tempo em que fortalece suas relações comerciais com a China, especialmente no agronegócio e em infraestrutura, o país enfrenta uma pressão crescente vinda de Washington. Só em 2024, a China foi destino de 30% das exportações brasileiras, com destaque para soja, minério de ferro e carne.
Na prática, especialistas avaliam que o governo brasileiro deverá adotar um discurso de equilíbrio. “O Brasil busca não ser obrigado a escolher um lado. Participa do BRICS com protagonismo, mas também precisa manter as portas abertas com os EUA, que continuam sendo um parceiro estratégico, principalmente em setores como tecnologia e segurança”, afirma Ana Paula Oliveira, consultora de comércio exterior.
China e Brasil: alinhamento em pauta
A reação de Pequim à nova ofensiva americana também reforça o cenário de alinhamento sino-brasileiro. Na última sexta-feira (11), a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Mao Ning, declarou que “as tarifas não devem ser uma ferramenta de coerção, intimidação ou interferência” e reiterou o apoio ao Brasil frente às medidas norte-americanas.
Nos bastidores, fontes diplomáticas confirmaram à Agência Brasil China que a questão será discutida em novas rodadas de diálogo bilateral nas próximas semanas, com foco em alternativas para ampliar o comércio fora da órbita do dólar, incluindo o uso de moedas locais e mecanismos multilaterais como o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), também conhecido como Banco do BRICS.
Multipolaridade no centro do debate
Independentemente dos desdobramentos práticos da tarifa extra, o episódio marca mais um capítulo da disputa global por influência econômica e política. O BRICS, ao ampliar sua voz no cenário internacional, força Washington a reposicionar sua estratégia, enquanto Brasil e China consolidam uma parceria que vai além do comércio: envolve, agora, uma visão compartilhada de um mundo menos dependente de um único polo de poder.