A jornalista árabe Layla Haddad, do portal Al Araby, revelou neste domingo (26/05) quais veículos da mídia hegemônica norte-americana que colaboram com o regime sionista de Israel. Jornais e emissoras que, em suas publicações e transmissões, amplificam a narrativa israelense e minimizam a situação dos palestinos vítimas do genocídio que Tel Aviv promove na Faixa de Gaza desde 7 de outubro de 2023.
Entre os exemplos mencionados por Haddad, destaca-se o canal de notícias de televisão CNN, um dos mais assistidos em âmbito global.
“A maior rede de mídia está enfrentando uma de suas piores crises após seis jornalistas terem vazado, ao jornal britânico The Guardian, documentos sobre claras instruções administrativas para que, desde o início da guerra, [a redação] estivesse ao lado de Israel. Mas o que nos referimos quando falamos de ‘claras instruções administrativas’? Mark Thompson, o novo editor-chefe e diretor executivo da rede, que foi nomeado dois dias após o 7 de outubro”, disse a jornalista, por meio de um vídeo publicado em rede social.
Haddad explica que o relacionamento entre editor-chefe da CNN e Israel começou no tempo em que Thompson atuava como diretor-geral da rede britânica BBC, entre 2004 a 2012.
“Em 2005, Thompson foi até a Palestina ocupada, onde se encontrou com (ex-primeiro-ministro israelense) Ariel Sharon. Depois desse encontro, decidiu demitir a correspondente da BBC em Jerusalém, curvando-se à pressão israelense ao acusá-la de antissemitismo. Em 2009, Thompson se recusou a divulgar um apelo de caridade na coleta de doações destinadas a Gaza no momento em que o enclave estava sob agressão israelense. Em 2011, ele pediu á Radio 1xtra da BBC para retirar a frase ‘Free Palestine’ (Palestina Livre, em sua tradução) de uma música de rap”, contou Haddad.
Orientações de Mark Thompson na CNN
A reportagem do The Guardian citada pela jornalista, que fala em “instruções administrativas” na CNN, foi publicada em 4 de fevereiro de 2024. Intitulada Funcionários da CNN dizem que inclinação pró-Israel da rede equivale a ‘má prática jornalística’, a matéria consiste no relato de seis profissionais que trabalham na emissora norte-americana e revela que “as decisões diárias de notícias são moldadas por um fluxo de diretrizes da sede da CNN, em Atlanta”.
“Elas incluem restrições rígidas para citar o Hamas e relatar outras perspectivas palestinas, enquanto as declarações do governo de Israel são tomadas pelo valor de face. Além disso, todas as histórias sobre o conflito devem ser esclarecidas pelo escritório de Jerusalém antes da transmissão ou publicação”, resume o The Guardian.
A reportagem ainda cita diretamente o nome de Mark Thompson, relatando que “jornalistas da CNN dizem que o tom da cobertura é dado no topo por seu novo editor-chefe e CEO, Mark Thompson, que assumiu seu cargo dois dias após o ataque de 7 de outubro”, e acrescentando que alguns funcionários da redação se mostram “preocupados” com a postura da chefia, uma vez que “em um antigo cargo como diretor-geral da BBC, ele foi acusado de ceder à pressão do governo israelense em várias ocasiões, incluindo a exigência para remover um dos correspondentes mais proeminentes da corporação de seu cargo em Jerusalém, em 2005”.
O The Guardian também teve acesso a uma nota recebida via e-mail pela equipe de jornalistas da CNN, no final de outubro de 2023, quando as operações israelenses passavam a se intensificar no enclave e o número de fatalidades em Gaza aumentava de forma evidente.
O comunicado indicava “um conjunto de diretrizes” para a cobertura e nela chamava a atenção uma instrução particular “de Mark”. O parágrafo em questão dizia que embora a CNN relatasse as consequências do ataque israelense e o contexto histórico da guerra, era preciso “continuar sempre lembrando o nosso público da causa imediata deste conflito atual, ou seja, o ataque do Hamas e o assassinato em massa e sequestro de civis”.
O mesmo e-mail orientava que, para qualquer citação do número de vítimas divulgado pelo Ministério da Saúde de Gaza, deveria se dizer que se tratava de registros de uma pasta “controlada pelo Hamas”, implicando que os relatos das mortes de milhares de mulheres e crianças não são confiáveis, embora a credibilidade daquelas estatísticas fosse garantida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e outros órgãos internacionais.
Reunião interna da CNN
Após obter uma gravação vazada de uma reunião interna no escritório da CNN em Londres, na data referente a 13 de fevereiro, o portal The Intercept divulgou, em 1º de março, uma reportagem investigativa sob o título Em reunião interna, Christiane Amanpour confronta CNN sobre ‘dois pesos e duas medidas’ na cobertura de Israel, revelando que “funcionários da CNN, incluindo a renomada âncora de notícias internacionais Christiane Amanpour, confrontaram executivos da rede sobre o que os funcionários descreveram como inúmeras falhas de liderança na cobertura da guerra de Israel em Gaza”.
A matéria fala que funcionários se declararam “envergonhados e desonrados” com a cobertura do canal, questionando o painel de executivos sobre “os protocolos da CNN” na veiculação dos acontecimentos em Gaza e o “clima hostil para repórteres árabes”.
“Os executivos – o CEO da CNN Worldwide e editor-chefe da CNN, Mark Thompson, a editora-executiva da CNN EUA, Virginia Moseley, e o gerente-geral da CNN International, Mike McCarthy – responderam dando amplas garantias de que as preocupações dos funcionários estavam sendo ouvidas, ao mesmo tempo em que defendiam o trabalho da CNN e apontavam para o obstáculo persistente de obter acesso dentro da Faixa de Gaza”, disse a reportagem.
Durante o interrogatório aberto por Thompson, um dos jornalistas que trabalhou no Líbano teria questionado “o processo de coleta de notícias e como ele se desenrolou”, acrescentando uma pergunta aos executivos.
“O que vocês fizeram e o que estão fazendo para enfrentar o discurso de ódio que informa nossa cobertura, especialmente nos primeiros meses da guerra?”
Segundo o The Intercept, Thompson teria respondido estar “satisfeito com a forma em que a rede cobriu a guerra”, justificando que “é impossível fazer esse tipo de história onde há pessoas com opiniões incrivelmente fortes de ambos os lados” sem “às vezes cometer erros”.
“Acho que o fato de que tem sido muito difícil para nós entrar totalmente no território de Gaza, desde um período relativamente recente e até hoje, tornou difícil para a tarefa de entregar o tipo de histórias pessoais individualizadas de como tem sido para o povo de Gaza, da maneira como tem sido possível com a história das famílias dos assassinados e sequestrados pelo Hamas”, respondeu o editor-chefe da CNN.
Cúmplices do genocídio
Além da CNN, a jornalista árabe Layla Haddad também exemplificou outros veículos norte-americanos que, desde 7 de outubro, apoiam as ações israelenses contra os palestinos.
Um dos citados pela jornalista é o Wall Street Journal, responsável pela reportagem da autoria de David Luhnow e Carrier Keller-Lynn que alegou que 10% dos funcionários da UNRWA (Agência da ONU para Refugiados Palestinos) estariam ligados ao Hamas e à Jihad Islâmica, enquanto 12 teriam supostamente participado da operação do Hamas em 7 de outubro — levando diversos países ocidentais a suspenderem seus repasses à agência.
“Quem é Carrier Keller-Lynn? É uma jornalista americana-israelense que serviu no exército de ocupação israelense em 2009 e que, numa entrevista, falou sobre seu ativismo anti-Palestina durante seus tempos universitários nos Estados Unidos”, contou Haddad.
Outro exemplo é a revista The Atlantic, que em uma de suas recentes matérias publicadas questionou os números de palestinos mortos e feridos, sobretudo de mulheres e crianças, divulgados pelo Escritório das Nações Unidas para Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA, por sua sigla em inglês) ao longo da guerra.
Em 17 de maio, o veículo publicou a matéria The UN’s Gaza Statistics Make No Sense (“As Estatísticas da ONU sobre Gaza Não Fazem Sentido”, em sua tradução), que, segundo Haddad, busca justificar “legalmente” a morte de crianças palestinas.
A jornalista árabe lembra que o editor-chefe de The Atlantic, Jeffrey Goldberg, chegou a ser voluntário em uma base militar de ocupação israelense na década de 90, e que serviu na prisão de Ktzi’ot: o maior centro de detenção de Israel durante a Primeira Intifada.
“Durante seu serviço militar, ele testemunhou e participou da tortura de palestinos detidos, assim como ele mesmo conta em seu livro Prisoners (Prisioneiros, em sua tradução)”, revelou a jornalista.
O último jornal mencionado foi o The New York Times, do qual Haddad contextualizou o histórico de quatro de seus funcionários ligados diretamente a Israel.
Ronan Berman, o correspondente do veículo em Tel Aviv, e responsável pela maioria das reportagens relacionadas à guerra em Gaza, já serviu o exército de ocupação israelense; Isabel Kershner, autora de uma matéria recentemente publicada prestigiando a participação de soldadas israelenses no conflito, tem atualmente dois filhos no exército de Tel Aviv; David Brooks, com um filho atuando nas Forças Armadas de Israel (IDF, por sua sigla em inglês), afirmou em 2014 ao Hareetz que “a guerra em Gaza provou ao meu filho que servir às IDF estava correto”; e Joe Kahn, filho de um dos integrantes da CAMERA (Comitê de Precisão em Relatórios do Oriente Médio na América, organização norte-americana pró-Israel de monitoramento de mídia), Leo Kahn, trabalha como editor-executivo do NYT e é responsável por determinar a maioria do conteúdo veiculado pelo jornal.
Assista ao vídeo de Layla Haddad: