Em plena metrópole de São Paulo, a milhares de quilômetros de Jiangsu, na China, a educadora Sun Yanping tem sido protagonista na construção de uma sólida ponte cultural entre Brasil e China. À frente da escola “Tiantian Huáqiáo” (Escola de Educação para Chineses no Exterior), ela tem transformado a realidade do ensino de língua e cultura chinesa há 14 anos — sempre com o olhar voltado para a inovação e para as novas gerações da comunidade chinesa no Brasil.
De carregar livros na mala à construção de uma plataforma digital própria de ensino, Sun percorreu um longo caminho. “Começamos com o básico. Minha sogra era uma professora muito conhecida e unimos forças. Eu cuidava da gestão e dos professores, e ela dava aula”, conta. O nome da escola é inspirado em uma célebre frase de Mao Zedong: “Estudar bem e progredir todos os dias”.
A entrada da escola na educação formal brasileira começou em 2014, com uma parceria inédita com a tradicional Escola da Polícia Militar Azul Cruz. Hoje, a “Tiantian” tem quatro unidades e colabora com mais de dez escolas da rede pública e privada em São Paulo, com atividades que vão do reforço escolar ao ensino artístico e esportivo.

Do improviso à digitalização
Os maiores desafios vieram com o tempo. Em 2015, a distância da China e a burocracia alfandegária dificultavam o envio de livros. “Muitos professores levavam materiais nas malas, mas nunca era o suficiente”, relembra Sun. A solução veio com a criação de um sistema próprio de ensino online, inspirado no conceito de “fabricação inteligente de Jiangsu”. O projeto ganhou força durante a pandemia e hoje se estende por todo o território brasileiro. “Temos uma grade digital completa do jardim até o nono ano. Isso atrai muitos estudantes de fora de São Paulo”, diz, orgulhosa.
A escola também promove exames oficiais de proficiência (HSK) em parceria com o Instituto Confúcio. “Todo ano, nossos alunos vão para universidades na China. O sonho agora é fazer parcerias com instituições de ensino em Jiangsu, para que esses jovens voltem para estudar na terra de seus ancestrais”, explica Sun.
Tradição chinesa com sotaque latino
Filha de Yangzhou, Sun faz questão de levar a identidade cultural da cidade para a sala de aula. Já está em desenvolvimento um programa de intercâmbio temático que inclui visitas a jardins tradicionais e experiências com a delicada cultura Wu. A escola abriga uma biblioteca com mais de 2 mil livros — 520 deles doados pela Biblioteca de Chineses no Exterior de Nantong, cada exemplar acompanhado de mensagens escritas por crianças chinesas.
No currículo, Sun uniu a poesia clássica aos ritmos brasileiros, como o samba. A matemática de Jiangsu virou “aula de mágica oriental” e o resultado agrada: nas comemorações escolares, crianças chinesas dançam capoeira enquanto brasileiros cantam “Jasmine Flower” em português.


Educação de mão dupla
Com o crescimento das relações comerciais entre Brasil e China, Sun percebe um novo desafio: formar profissionais bilíngues. “Hoje, apenas 15% da demanda é suprida. Queremos ajudar a mudar isso”, afirma. Para tanto, ela quer firmar parcerias com universidades chinesas e propor iniciativas concretas, como a criação de um fundo de intercâmbio sino-brasileiro voltado para jovens talentos.


Um dos projetos em curso prevê levar 100 estudantes brasileiros para uma viagem de estudos na China — sendo Jiangsu o destino prioritário. “A ideia é formar não só fluentes em mandarim, mas verdadeiros embaixadores culturais”, diz.


De São Paulo para o futuro
Na biblioteca da escola em São Paulo, Sun aponta no mapa o que chama de “rota educacional digital”: nos próximos cinco anos, ela quer expandir o modelo da “Tiantian” para o Rio de Janeiro e Brasília. “Vamos integrar conteúdos da região do Delta do Rio Yangtzé, com provas-modelo de Jiangsu, exames simulados de universidades e até temas como economia regional e tecnologia”, revela.
Outro plano ambicioso é criar uma ponte permanente entre professores dos dois países. “Queremos trazer educadores de Jiangsu para oficinas imersivas aqui no Brasil e levar docentes brasileiros para vivências na China.”
Ao final da entrevista, ela compartilha um vídeo: alunos paulistanos declamando, em dialeto de Yangzhou, o clássico poema “Despedida do Amigo no Pavilhão da Garça Amarela”. Do outro lado da tela, parentes em Jiangsu se emocionam. Uma cena simples, mas que resume bem a missão de Sun Yanping: levar o idioma, a cultura e o coração da China para bem além das fronteiras.

