China deve a Musk o desenvolvimento da indústria de carros elétricos?

Pelo contrário, sem o mercado chinês a Tesla, empresa do bilionário que virou garoto-propaganda da extrema direita, sequer teria bateria para funcionar

(Foto: Xinhua)

Em meio ao oceano de fake news que inunda as redes sociais, uma delas é de que o mercado chinês de produção de veículos elétricos (EV, da sigla em inglês) e suas baterias de lítio deve o seu desenvolvimento à Tesla.

O setor de carros elétricos da China não deve absolutamente nada à empresa de propriedade do bilionário que virou garoto-propaganda da extrema direita, Elon Musk.

É o contrário. Sem as baterias chinesas não haveria carros da Tesla. 

A CATL, empresa chinesa líder de produção de células lítio-ferro-fosfato (LFP), nome dessas baterias para EVs, é um dos principais fornecedores de células da Tesla para carros elétricos, e as duas empresas são bastante interdependentes. 

Antes de a Tesla começar a diversificar seu fornecimento e comprar células LFP da fabricante chinesa de automóveis e gigante de baterias BYD, a CATL era seu único fornecedor para esta química de célula. 

Um pouco mais da metade das vendas globais da Tesla são representadas pelas versões LFP do Model 3 e Model Y e o Megapack atual também usa células da CATL.

Em 2021, a Tesla foi o maior cliente individual da empresa chinesa, respondendo por 10% das vendas na época.

Fábrica dos EUA com tecnologia chinesa

No mês passado, a Bloomberg informou que a Tesla planeja comprar equipamentos de produção da CATL para instalação em uma nova fábrica de baterias na cidade de Sparks, que poderia entrar em operação em 2025. 

A Tesla terá controle total sobre a fábrica e arcará com todos os custos, enquanto os funcionários da CATL apenas ajudarão a configurar o equipamento.

A planta fabricará células LFP para as baterias estacionárias Megapack da Tesla, com uma capacidade anual inicial de cerca de 10 GWh. 

Em 2021, a Tesla anunciou que o armazenamento estacionário, como o Powerwall para usuários domésticos e os Megapacks para armazenamento de energia estacionária de grande porte, seria convertido em células LFP – em parte devido à disponibilidade de ferro. 

Embora o projeto seja voltado para baterias estacionárias, uma expansão posterior para células LFP para carros elétricos parece totalmente concebível. 

A Tesla também vê o acordo com a CATL para comprar equipamentos como uma maneira econômica de configurar novas instalações.

Subsídio do governo dos EUA

Nos Estados Unidos, a Lei de Redução da Inflação oferece créditos fiscais para quem produz baterias localmente. 

O governo federal paga em torno de US$ 35 por kWh. No entanto, a produção local não tem acompanhado a fabricação de modelos elétricos. Com as regras mais rígidas em 2024, uma menor quantidade de modelos entra nessa linha de crédito fiscal.

O Tesla Model 3, por exemplo, perdeu o incentivo na maioria das configurações. Dessa forma, o modelo pode sair mais caro que o Model Y, tornando a compra menos interessante. 

Atualmente, a marca de elétricos de Musk utiliza as baterias da Panasonic nos Model 3, Y, S e X. No começo deste ano,a empresa anunciou que vai aumentar a densidade das células e o nível de produção. Dessa forma, vai ter uma produção adicional em sua fábrica no Kansas.

A Tesla também importa muitas células e componentes da China. Também produz poucas células em sua giga fábrica no Texas. No entanto, todas são de uso exclusivo para a picape Cybertruck. 

A montadora está buscando meios para tornar a produção de seus elétricos menos custosa, para compensar o preço final do veículo.

O que mostra outra lorota de Musk. Ele não defende estado mínimo para ele e suas empresas. Só para o povo.

Quem copia quem?

Resumo da ópera: a Tesla copiou as empresas chinesas e não o contrário. Afinal, é a BYD a pioneira no conceito de ser uma empresa de automóveis EV que produz as suas próprias baterias. 

A BYD começou a fabricar as próprias baterias em 1995, nove anos antes de a Tesla existir e 17 anos antes do lançamento do Modelo S.

A gigante chinesa de EV lançou seu primeiro veículo elétrico quatro anos antes do Modelo S da Tesla.

Mercado gigante da China

Isso sem falar que a Tesla vende cerca de um terço dos seus carros elétricos para o mercado chinês e fabrica mais de metade dos seus carros na China.

A empresa de Musk se instalou na China exatamente por isso: um enorme mercado e um centro industrial mundial, onde é possível produzir coisas com mais eficiência. 

O próprio dono da Tesla reconhece isso. Em novembro de 2023, o bilionário disse na conferência Dealbook do The New York Times que a China é de longe o mercado mais competitivo da Tesla.

A declaração foi feita no contexto em que o fabricante chinês de veículos elétricos BYD se preparava para ultrapassar a Tesla como a maior fabricante de carros elétricos do mundo.

“A China é muito boa na produção e a ética de trabalho é incrível. Se considerarmos as diferentes ligas de competitividade na Tesla, consideramos a liga chinesa a mais competitiva”, declarou Musk.

Competitividade da China

No frigir dos ovos, a Tesla não se instalou na China como uma armadilha para ter sua tecnologia “roubada” pelos chineses. Na realidade, se a empresa de Musk não tivesse se instalado na China seria menos competitiva.

Até Musk admite isso. Ele falou sobre esse tema no mesmo evento do jornal estadunidense em novembro do ano passado.

“Até agora, a competição da Tesla está na China. Há muitas pessoas por aí que pensam que as 10 principais empresas de automóveis serão a Tesla seguida por nove empresas de automóveis chinesas. Acho que elas podem não estar erradas”, acrescentou o CEO da Tesla.

A China é o mercado de EV mais importante do mundo, respondendo por 59% das vendas globais em 2022, de acordo com o Fórum Econômico Mundial.

A grande presença da Tesla na China tem sido alvo de escrutínio nos últimos anos por temores de que possa fornecer ao governo chinês alavancagem sobre Musk e suas outras empresas – algo que o chefe da SpaceX e proprietário da X refutou no evento Dealbook.

“A Tesla tem uma das quatro fábricas na China, e a China representa um quarto do nosso mercado.O mesmo vale, aliás, para todas as outras montadoras – elas também têm algo em torno de um quarto de suas vendas na China. Então, se isso é um problema para a Tesla, é um problema para todas as montadoras”, afirmou Musk.

Liderança chinesa em carros elétricos

Musk, no mesmo evento do The New York Times no ano passado, comentou que a própria natureza da concorrência é que você precisa competir.

“Se a Tesla não fosse para a China, não se adaptaria à concorrência chinesa e, como resultado, seria menos competitiva. É como um atleta: se você quer melhorar e entender o seu valor, em algum momento você precisa ir para a grande liga”, comparou.

A China é a grande liga da indústria de EV. Ao contrário do que o oceano de fake news espalha pelas redes sociais, indústria chinesa de carros elétricos não começou com a decisão da Tesla de fabricar carros na potência asiática em 2019. 

Na verdade, a maioria dos concorrentes da Tesla é anterior ao momento em que a Tesla começou a fabricar carros na China: Nio começou em 2014, XPeng em 2014, Li Auto em 2015, a BYDv lançou seu primeiro EV em 2008.

A BYD, inclusive, ultrapassou a Tesla no título de maior vendedor mundial de veículos elétricos no quarto trimestre de 2023, vendendo cerca de 530 mil exemplares, superando os 485 mil da Tesla.

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