A trégua entre Irã e Israel, anunciada nesta terça-feira (24) após mediação dos Estados Unidos, começou sob um clima de forte desconfiança. Poucas horas depois do início oficial do cessar-fogo, os dois países trocaram acusações de violações ao acordo, levantando dúvidas sobre a durabilidade da paz frágil alcançada após quase duas semanas de confrontos intensos.
Segundo autoridades iranianas, Israel teria realizado três ataques a pontos dentro do território do Irã até às 9h no horário local. Do lado israelense, o governo acusa Teerã de seguir com o lançamento de mísseis, o que foi negado pelas Forças Armadas do Irã. O ministro da Defesa de Israel, Israel Katz, prometeu uma resposta “com força” caso novos ataques sejam confirmados.
A trégua negociada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, previa que o Irã suspendesse todas as suas ações militares a partir da meia-noite em Washington (1h de Brasília), enquanto Israel teria até doze horas depois para fazer o mesmo. A condição, segundo Tel Aviv, foi aceita sob a justificativa de que seus “objetivos militares” — como a eliminação da suposta ameaça nuclear e balística iraniana — foram cumpridos.
Conflito deixou vítimas antes da trégua
Antes do anúncio do cessar-fogo, o cenário era de intensa violência e perdas humanas. Um míssil iraniano atingiu um edifício em Berseba, no sul de Israel, matando quatro civis. Em resposta, bombardeios israelenses provocaram ao menos nove mortes no norte do Irã. O Conselho de Segurança Nacional iraniano declarou que, embora a trégua esteja em vigor, o país segue “com os dedos no gatilho” e pronto para reagir a qualquer nova ofensiva.
O início da escalada foi registrado em 13 de junho, quando Israel bombardeou instalações no Irã alegando uma ameaça iminente, baseada em um relatório da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) — que, por sua vez, desmentiu a gravidade das acusações. Desde então, o confronto escalou rapidamente, com o envolvimento direto dos Estados Unidos no último sábado (21), por meio de ataques a estruturas nucleares iranianas.
Repercussão internacional e posição do BRICS
A crise traz impacto direto para a geopolítica internacional e deve estar no centro das discussões da próxima cúpula do BRICS, marcada para julho no Rio de Janeiro. O Irã, recém-admitido no bloco, estará presente ao lado de China, Brasil, Índia, Rússia e África do Sul. A presença de um dos protagonistas do conflito torna ainda mais delicada a tentativa de se construir um posicionamento conjunto.
A China tem se mostrado contrária a ações unilaterais e criticou publicamente os bombardeios liderados pelos EUA. Já o Brasil, que preside o BRICS este ano, deverá atuar como articulador diplomático, defendendo o diálogo e uma solução pacífica, como já vem fazendo em outras instâncias multilaterais.
O impacto sobre o Brasil
Ainda que distante geograficamente, o Brasil observa com atenção os desdobramentos do conflito. O país mantém laços comerciais relevantes com o Oriente Médio, especialmente no setor de fertilizantes — cuja cadeia de fornecimento já foi afetada por tensões anteriores entre Irã e Israel. Além disso, o aumento da instabilidade pode impactar os preços do petróleo e pressionar a inflação global.
Para analistas brasileiros, o conflito também pode influenciar os debates sobre segurança internacional no BRICS, além de testar a capacidade do bloco de se posicionar de forma coesa em temas sensíveis. “A atuação do Brasil como anfitrião pode ser decisiva para mostrar que o BRICS pode ir além da retórica econômica e contribuir de forma efetiva para a paz global”, afirma a cientista política Ana Carolina Leal, da Universidade de Brasília.
Enquanto o cessar-fogo segue pendendo por um fio, os olhos do mundo — incluindo os de Brasília e Pequim — se voltam para o Oriente Médio. O que acontecer nas próximas horas pode determinar não apenas o rumo da crise, mas também o papel que atores globais, como o BRICS, terão no novo equilíbrio de forças internacional.