O Brasil surpreendeu o mundo no primeiro trimestre de 2025: com um crescimento de 1,4% no PIB, foi o país que mais expandiu sua economia entre as 20 maiores potências globais, desbancando até a China (1,2%) e a Turquia (1%). Os dados, divulgados pelo IBGE e celebrados pelo Ministério da Fazenda, revelam um feito histórico — mas também expõem contradições e desafios para um país que ainda depende de commodities e vê sua indústria patinar.
O agro no volante, a China no retrovisor
O salto de 12,2% no setor agropecuário foi o motor do desempenho brasileiro, compensando a estagnação da indústria (-0,1%) e o modesto avanço dos serviços (0,3%). Mas há um detalhe que não aparece nas manchetes: parte expressiva dessa produção rural tem destino certo — a China, maior parceira comercial do Brasil, que responde por 32% das exportações agrícolas nacionais. Enquanto o agro celebra, porém, o governo Lula enfrenta um quebra-cabeça: como diversificar a economia quando até o frango — outro carro-chefe das vendas à China — sofre embargo sanitário por gripe aviária?
Crescimento com pés de barro?
A liderança no G20 esconde assimetrias. Na comparação anual, o Brasil (2,9%) ainda fica atrás da China (5,4%) e da Indonésia (4,9%). E há um contraste gritante: o mesmo país que exporta soja e minério em volume recorde vê produtos chineses inundarem seu mercado interno — as importações da China subiram 35% no trimestre, puxadas por navios e plataformas de petróleo. “A indústria brasileira não é competitiva. Um excesso de produtos chineses pode estrangular setores estratégicos”, alerta Leandro Gilio, do Insper Agro Global, em entrevista ao Valor Econômico.
O lado B da parceria Brasil-China
Os números do PIB chegam em um momento delicado para a relação bilateral. Se, por um lado, o comércio entre os países atingiu US$ 38,9 bilhões entre janeiro e abril, por outro, Pequim acaba de impor um embargo total à carne de frango brasileira — decisão que contrasta com a flexibilidade de Japão e Emirados Árabes, que restringiram apenas o Rio Grande do Sul. Para especialistas, a crise sanitária testa a resiliência de uma parceria que já foi chamada de “casamento de conveniência”: “A China precisa de comida, o Brasil precisa de investimentos. Mas relações assimétricas exigem diplomacia ágil”, pondera Lívio Ribeiro, especialista em economia chinesa.
O que vem por aí
O governo projeta otimismo. O ministro Carlos Fávaro (Agricultura) trabalha para convencer a China a adotar restrições regionais, como fez a Rússia, enquanto o Planalto aposta em novos acordos para atrair investimentos chineses em infraestrutura. Mas o cenário global preocupa: com os EUA em recessão técnica (-0,2% no trimestre) e a guerra comercial sino-americana escalando, o Brasil pode ser tanto beneficiário quanto refém das tensões. “Se a China diversificar compras de soja para a Argentina, nosso crescimento pode esbarrar”, admite um técnico do Ministério da Fazenda, sob condição de anonimato.
Para o brasileiro médio, a lição é clara: o país cresce, mas ainda dança conforme a música dos ventos internacionais — e do apetite chinês. Enquanto isso, o desafio é transformar o PIB do agro em desenvolvimento que chegue à mesa de quem produz e consome.