Estimulado pela vacinação contra a Covid-19, o setor de turismo apresenta sinais de melhora no Brasil e espera que a retomada ganhe força nos próximos meses com os feriados e as festas de final de ano.
Enquanto a atividade econômica segue fragilizada, o que anima o setor é a combinação entre restrições menores à circulação de pessoas e demanda reprimida por viagens durante a pandemia.
Apesar de ainda estar abaixo do patamar pré-crise, o turismo vem reduzindo os prejuízos nos últimos meses. Cálculos da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) ilustram o cenário.
Em agosto, a diferença entre as receitas e o potencial de geração do setor diminuiu pelo quinto mês consecutivo. No período, a perda em relação à capacidade de faturamento foi de R$ 15,3 bilhões. Trata-se da menor diferença desde o início da pandemia.
“De fato, há uma melhora, principalmente em alguns subsetores do turismo, como hospedagem e transporte aéreo”, afirma Fabio Bentes, economista da CNC.
“A gente acredita em uma aceleração no quarto trimestre, diretamente relacionada ao avanço da circulação de pessoas.”
No ano passado, o volume de receitas do turismo despencou 36,6% no país. Em 2021, a perspectiva é de alta de 19,8%, indica a CNC.
Conforme Bentes, o avanço só não é maior porque existem ameaças como a escalada da inflação.
Em razão do aumento dos preços de itens básicos, como alimentos e energia elétrica, a fatia do orçamento familiar destinada a despesas não essenciais, incluindo viagens e passeios, fica menor, explica o economista.
De acordo com a CNC, o turismo deve alcançar a recuperação plena do nível de receitas durante o segundo trimestre de 2022. A estimativa anterior apontava para o quarto trimestre do próximo ano.
Dados de buscas no Google mostram que o interesse dos brasileiros por viagens atingiu, em setembro, o maior patamar desde março do ano passado. A procura mira especialmente em datas como Réveillon e Natal.
“A gente tem visto uma vontade maior das pessoas. Elas querem voltar a realizar sonhos, e um deles é viajar”, aponta Mônica Carvalho, diretora de negócios para viagens, mobilidade, serviços financeiros, telecomunicações e entretenimento do Google Brasil.
“O ritmo de vacinação e o menor isolamento social acabam ajudando o planejamento.”
A cidade do Rio de Janeiro foi o destino doméstico mais procurado no Google por brasileiros em agosto. Conforme o HotéisRIO (Sindicato dos Meios de Hospedagem do Município do Rio de Janeiro), a ocupação dos hotéis locais vem avançando nos últimos meses.
Está na faixa de 65% a 70% aos sábados e domingos, quando há uma presença maior de turistas que frequentam a cidade em busca de lazer.
Durante a semana, o percentual tem sido menor, perto de 40%, devido à escassez de eventos corporativos.
Segundo Alfredo Lopes, presidente do HotéisRIO, a expectativa é de movimentação superior nos próximos meses, com o embalo da vacinação e das restrições menores.
A Prefeitura do Rio, aliás, já sinalizou que deseja autorizar as festas de Réveillon e Carnaval, sem medidas restritivas, desde que as condições da pandemia permitam.
“A gente acredita que a grande virada será a partir do Réveillon”, diz Lopes. “Já tem hotéis na Barra da Tijuca e na zona sul com 80% da ocupação reservada para o final do ano”, acrescenta.
O dirigente afirma que, na pandemia, a rede hoteleira da cidade vem recebendo principalmente turistas de estados mais próximos, como São Paulo.
O casal de Santos (SP) Jorge Calazans, 46, e Mayra Dias, 47, faz parte desse grupo. No último dia 6, uma quarta-feira, os dois advogados viajaram de carro até o Rio, em um trajeto de aproximadamente sete horas.
Inicialmente, o deslocamento foi motivado por compromissos profissionais agendados para os dois dias seguintes. Mas, com a proximidade do final de semana, o casal decidiu esticar a estadia na capital fluminense até o domingo (10).
A ideia foi fazer passeios pela cidade, evitando aglomerações, dizem os advogados, que já foram vacinados contra a Covid-19. O local escolhido para a hospedagem foi um hotel na zona sul com vista para um dos cartões postais da cidade, o Pão de Açúcar.
“Com a vacinação, a gente fica um pouco mais à vontade”, conta Mayra.
Além do Rio, outros destinos tradicionais do país, como o Nordeste, continuam despertando o interesse de turistas, relata Marina Figueiredo, vice-presidente da Braztoa (Associação Brasileira das Operadoras de Turismo).
Segundo ela, o setor passou a sentir uma melhora mais nítida nos negócios a partir da metade deste ano. Marina associa o avanço à imunização contra a Covid-19 e à retomada da malha aérea nacional.
“Ainda é difícil estimar quando vamos alcançar o nível pré-pandemia, mas o cenário ficou mais positivo”, comenta.
“Temos mais destinos sendo vendidos, e o medo das pessoas ficou menor com a vacina. Isso dá uma perspectiva de final de ano muito melhor do que a do ano passado.”
Em setembro, a malha doméstica do setor aéreo cresceu pelo quinto mês consecutivo, conforme a Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas). A média foi de quase 1.800 partidas por dia.
O resultado equivale a 74,6% da oferta de voos das companhias nacionais antes do impacto da pandemia, no início de março de 2020. O percentual é o maior desde o último mês de janeiro (74,8%).
“A maioria do público que está a bordo neste momento busca lazer”, menciona Eduardo Sanovicz, presidente da Abear.
Segundo o dirigente, a expectativa é alcançar, no primeiro trimestre de 2022, os 100% da malha aérea pré-crise. Sanovicz destaca o estímulo gerado pela vacinação, mas alerta para desafios que permanecem no horizonte do setor.
Entre eles, está o preço do querosene de aviação, pressionado pelo dólar alto e pela valorização do petróleo. O valor do combustível disparou 91,7% no segundo trimestre, em relação a igual período do ano passado, relatou a Abear em nota. Na visão da entidade, o aumento pode frear a retomada do setor aéreo.
O avanço dos custos gera reflexo para o bolso do consumidor. Em 12 meses até setembro, as passagens aéreas subiram 56,81% no país, conforme o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
“Pegamos muita tempestade ao longo da pandemia, e a chuva ainda não acabou. Os custos seguem subindo”, pontua Sanovicz.
Apesar da pressão dos combustíveis, o clima também é mais otimista no setor rodoviário. A plataforma de venda de passagens DeÔnibus, por exemplo, relata uma melhora mais consistente nos negócios a partir de maio.
Em setembro, a procura por bilhetes alcançou nível 30% superior ao de igual mês de 2019, conta Breno Moraes, CEO da empresa. O movimento traz uma dose de alívio para o caixa depois das perdas na pandemia.
“O comportamento dos últimos meses tem muito a ver com a vacinação”, analisa Moraes. “Também tem toda aquela tese da demanda reprimida. Há uma combinação de fatores.”