Nesta terça-feira (26), o vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento, Zhou Qiangwu, anunciou que a instituição, também conhecida como Banco do BRICS, disponibilizará de cerca de US$ 5 bilhões (cerca de R$ 24 bilhões) em empréstimos no ano de 2024.
Durante discurso no Fórum Anual de Boao, na China, Zhou afirmou que os obstáculos impostos pela pandemia de COVID-19 foram superados e o banco “está voltado aos trilhos”, reportou a Reuters.
Presidido pela ex-presidente do Brasil, Dilma Rousseff, o banco deve aumentar a alocação de recursos no Brasil, principalmente em projetos nas áreas de infraestrutura, energias renováveis e energia sustentável.
Criado em 2015 pelos membros fundadores do BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – o Novo Banco de Desenvolvimento tem sede em Xangai e escritórios regionais em cidades como Brasília e São Paulo.
“O banco é uma plataforma que está focada prioritariamente em economias em desenvolvimento, em economias emergentes. Por isso, ele tem alguns compromissos, de superar as lacunas entre as imensas necessidades dos países em desenvolvimento e os recursos escassos que estão disponíveis”, disse Rousseff à emissora chinesa CGTN.
No Brasil, o Novo Banco de Desenvolvimento já financiou projetos de proteção ambiental da Petrobras, nos estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro, alocou recursos na expansão da área de atuação e proteção ambiental da SABESP, em São Paulo, projeto de expansão de água e saneamento no estado de Pernambuco, entre outros.
A nacionalidade da presidente do Novo Banco não é garantia de que mais recursos sejam direcionados ao Brasil. No entanto, economistas ouvidos pela Sputnik Brasil avaliam positivamente a gestão da brasileira à frente do banco.
“Claro que ainda é cedo para avaliar, afinal ela assumiu há pouco menos de um ano. Mas [nesta gestão] ganha força a meta de chegar a 30% dos empréstimos oferecidos pelo banco em moedas locais“, disse o professor livre-docente do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pesquisador do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (CECON) Bruno De Conti à Sputnik Brasil.
Outras metas do banco para o período 2022-2026 são a alocação de 40% dos recursos do banco em projetos na área de adaptação e mitigação dos impactos das mudanças climáticas e expandir a representação feminina nos seus quadros administrativos.
“Além disso, parece haver empenho de Dilma em implementar uma ideia, na minha opinião excelente, de redirecionar um pouco o banco para financiamento na área de inovação e desenvolvimento tecnológico”, disse De Conti. “Financiar infraestrutura é parte da história, mas não é tudo. Bancos de desenvolvimento também têm que financiar inovação e tecnologia.”
Pignatari ainda nota o papel do banco no impulsionamento do comércio entre os membros, principalmente em função do mercado consumidor doméstico relevante dos cinco membros fundadores do BRICS.
Apesar do otimismo em relação aos US$ 5 bilhões anunciados pelo banco para o ano de 2024, o Novo Banco de Desenvolvimento ainda tem tamanho modesto, quando comparado a instituições tradicionais.
“Os montantes totais aprovados para crédito [do Novo Banco de Desenvolvimento] ainda são menores se comparados com outros bancos mais antigos e estabelecidos. Mesmo em relação ao brasileiro BNDES, ele ainda é um banco relativamente pequeno”, notou De Conti. “O Novo Banco de Desenvolvimento tem 200 funcionários, comparados a 2 mil do nosso BNDES.”
No entanto, a importância geopolítica do Novo Banco de Desenvolvimento coloca a instituição em uma posição única no sistema internacional, cuja relevância só tende a crescer.
“O banco acabou ganhando relevância em um ambiente geopolítico internacional cada vez mais competitivo”, disse o professor de Economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie Milton Pignatari. “Ele não só de fato se estabeleceu como uma alternativa para os países em desenvolvimento, mas também teve seu papel reconhecido pelas estruturas mais tradicionais.”
A vinculação do Novo Banco de Desenvolvimento ao fórum BRICS também fortalece sua relevância geopolítica. Apesar de ter sido criado pelos membros fundadores do BRICS, o Novo Banco de Desenvolvimento é uma estrutura separada, que conta com países-membros de fora do bloco, como Uruguai e Bangladesh.
“O banco não tem ‘BRICS’ no nome justamente porque tem vocação para se expandir”, notou De Conti. “O banco é chamado de ‘novo’ porque foi criado pelo Sul Global, […] por países não completamente alinhados à hegemonia dos EUA. É ‘novo’ porque nasceu em teoria para financiamento de investimento verde.”
A relevância geopolítica do banco o coloca em posição privilegiada para promover temas difíceis, como a reforma do sistema de governança financeira global. Estabelecido no período pós-Segunda Guerra Mundial na Conferência de Bretton Woods, este sistema é associado a instituições como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional e está centrado no uso de uma moeda hegemônica: o dólar.
“Está cada vez mais clara a necessidade de reforma do sistema financeiro internacional, e o banco do BRICS pode ter um papel nisso”, acredita De Conti. “O banco já inova ao propor uma estrutura de governança simétrica: os cinco membros do BRICS originais têm o mesmo poder de voto, enquanto no FMI os EUA têm de longe o maior poder de voto e veto.”
Ao contrário de seus pares de Bretton Woods, o Novo Banco de Desenvolvimento tampouco impõe pacotes amplos de condicionalidades aos países que recebem recursos.
“O crédito do FMI vem com um pacote de recomendações, que vão desde a implementação de medidas de austeridade fiscal, até reformas no sistema previdenciário e no mercado de trabalho”, disse De Conti. “As instituições de Bretton Woods são muito mais interventoras, elas tentam impor um certo modelo econômico que o Banco do BRICS não tenta impor.”
Mas os obstáculos para a implementação de um sistema financeiro internacional mais justo são significativos. A meta de concessão de créditos exclusivamente em moeda local para que o banco escape da armadilha do dólar, por exemplo, não deve ser atingida no curto e médio prazo.
“Não sou otimista no sentido de dizer que isso é fácil. Existem grandes obstáculos, tanto técnicos, quanto na esfera da economia política. Mas eu acho que é fundamental. Os [membros do] BRICS enquanto enfrentamento da ordem econômica estabelecida têm a obrigação, moral inclusive, de se esforçar nessa direção“, concluiu De Conti.