No dia 19 de setembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve seguir a tradição e proferir o discurso inaugural da 78ª Assembleia Geral da ONU, em Nova York, EUA.
O presidente brasileiro estará acompanhado de ampla delegação de ministros, incluindo Fernando Haddad (Fazenda), Marina Silva (Meio Ambiente), Mauro Vieira (Relações Exteriores), Nísia Trindade (Saúde), Paulo Pimenta (Comunicação) e Rui Costa (Casa Civil).
De acordo com fontes do Itamaraty ouvidas pelo portal G1, dentre os temas prioritários para o Brasil no evento estão as mudanças do clima, o combate às desigualdades e a fome, a defesa da democracia e da paz.
No entanto, é a reforma da governança global que deve dominar a agenda brasileira. Durante a mais recente Cúpula de líderes do BRICS, o Brasil logrou o apoio de todos os parceiros do grupo a uma reforma do Conselho de Segurança da ONU, órgão no qual almeja uma cadeira permanente. O Ministério das Relações Exteriores avalia que o Brasil nunca esteve tão perto de atingir esse objetivo central da política externa brasileira, reportou a revista Veja.
“O Conselho de Segurança é o principal órgão da ONU e exerce papel de verdadeiro xerife global”, disse o professor da Universidade de Relações Exteriores da China, Marcus Vinicius de Freitas, à Sputnik Brasil. “O Conselho é composto por países nuclearmente armados, que assumiram a função de garantidores da ordem global.”
Para o especialista, no entanto, o Brasil deve estar preparado financeira e militarmente para assumir novas responsabilidades, caso venha de fato a entrar nesse seleto grupo de países.
“O Brasil precisaria repensar o tipo de comprometimento financeiro que tem com a ONU e o estabelecimento de Forças Armadas melhor equipadas para atender às demandas internacionais”, alertou Freitas. “Não vejo isso sendo discutido de maneira contundente no Brasil.”
O especialista ainda questiona se o Brasil seria integrado no Conselho de Segurança de forma equiparada aos membros fundadores EUA, Rússia, China, Grã-Bretanha e França, isto é, com direito de vetar decisões internacionais.
“Se entrarmos sem o direito de veto, estaríamos sendo incluídos como um país de segunda classe”, considerou Freitas. “Por outro lado, dar o direito de veto a mais países pode inclusive piorar a dinâmica das relações globais, deixando a agenda internacional ainda mais travada.”
Apesar das limitações, o especialista concede que a adesão do Brasil ao Conselho de Segurança interessa, já que “é sempre melhor estar do lado de dentro da sala de reuniões, do que do lado de fora esperando as decisões serem tomadas”.
“O Brasil que tem se caracterizado por ser um anão diplomático, que gosta de ficar em cima do muro, terá que tomar decisões e apoiar determinadas ações no contexto internacional que podem alterar essa imagem de bom moço, de não querer interferir na agenda internacional”, disse Freitas. “A pergunta é se o Brasil estaria pronto para assumir liderança e abrir mão dessa ideia de país isento nas questões internacionais.”
Relevância da ONU
A tradição diplomática impõe a participação do presidente brasileiro na Assembleia Geral da ONU, órgão que segue relevante pela sua adesão praticamente universal e nominalmente igualitária.
“A Assembleia Geral da ONU coloca todos os países do sistema internacional em pé de igualdade ao propor o sistema de um país, um voto”, explicou Freitas. “Ela garante uma linha de diálogo aberta para questionar e debater grandes temas da atualidade.”
No entanto, o sistema ONU não foi capaz de acompanhar as mudanças econômicas e políticas ocorridas desde a sua fundação, em 1945.
“Além disso, o mandato da ONU é muito maior do que os fundos que ela arrecada, então há um descontentamento muito grande em relação ao que ela de fato entrega”, considerou Freitas.
Nesse contexto, outras instituições mundiais como o BRICS expandido ganham relevância, acredita o sócio-diretor da BRICS Strategic Solutions Ltd., Marcelo Knopfelmacher.
“Os [países do] BRICS possuem elementos, como a cooperação econômica e o alinhamento geopolítico, que não estão presentes em órgãos como a Assembleia Geral da ONU”, disse Knopfelmacher à Sputnik Brasil. “Essas dimensões ficam ainda mais densas com a expansão do BRICS.”
Durante a mais recente Cúpula de líderes do BRICS, na África do Sul, foi aprovada a primeira onda de expansão do grupo, com a adesão de seis países: Argentina, Arábia Saudita, Egito, Etiópia, Emirados Árabes Unidos e Irã.
“Claro que tanto a Assembleia Geral da ONU quanto o BRICS são relevantes. Mas, nesse contexto de nova ordem mundial […] a coesão e eficiência do BRICS é muito maior”, considerou Knopfelmacher. “Os [países do] BRICS já discutem moeda comum e a adesão de mais países a esse alinhamento de contraposição à predominância dos interesses do Ocidente.”
Apesar dos desafios geopolíticos, a 68ª Assembleia Geral da ONU deve se reunir entre os dias 16 e 22 de setembro, na sede da organização em Nova York. O presidente brasileiro deve chegar a Nova York no domingo (17). Na segunda-feira (18), cumprirá agenda com empresários, parlamentares e investidores na Bolsa de Valores de Nova York (NYSE, na sigla em inglês). Na terça-feira (19), Lula realizará o discurso inaugural da Assembleia Geral da ONU de 2023. Na quarta-feira (20), o brasileiro deverá se encontrar com o presidente norte-americano Joe Biden, para debater iniciativa de apoio à dignidade no ambiente de trabalho internacionalmente.