O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, disse que seu país pretende fazer parte do Brics – organização internacional formada originalmente por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul e que acaba de ganhar cinco novos membros: Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã.
Em longa entrevista concedida no primeiro dia do ano ao sociólogo e jornalista espanhol Ignacio Ramonet, publicada pelo jornal mexicano La Jornada, Maduro disse que o Brics representa “o futuro da humanidade”, e que já tem um “poder econômico definitivo”. Em 2023, os venezuelanos já tinham formalizado o pedido para participação no grupo.
“Apostamos no Brics como parte de um novo mundo, de um novo equilíbrio, como parte do conceito geopolítico bolivariano de um mundo de equilíbrio, um mundo de iguais. E também como parte do futuro da humanidade para o desenvolvimento dos investimentos dos Brics na Venezuela, para o desenvolvimento de grandes mercados para os produtos venezuelanos, para o desenvolvimento de relações multidiversificadas culturalmente, politicamente, institucionalmente, socialmente”, disse o presidente.
Em setembro de 2023, Maduro visitou a China e fez questão de se encontrar com a presidenta do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), o “banco do Brics”, Dilma Rousseff. Na entrevista a Ramonet, ele disse que as relações com o banco são “boas” e estão “avançando”, sem detalhar quais investimentos poderiam vir a ser feitos em seu país.
Críticas a Milei
O Brics poderia ter recebido um novo país sul-americano nesta virada de ano, a Argentina, mas o governo do país, agora chefiado por Javier Milei, recusou o convite. Para Maduro, a decisão de seu colega da Casa Rosada é um equívoco, e foi alvo de fortes críticas.
“O passo que deu para tirar a Argentina dessa enormidade que é o Brics é uma das coisas mais estúpidas e imbecis que Milei fez contra a Argentina. Ao retirar a Argentina dos Brics está agindo contra os argentinos, contra o trabalhador argentino, contra o empresário argentino”, apontou, reforçando que vai trabalhar para que a Venezuela ocupe a “vaga” deixada pela Argentina.
Maduro também não poupou críticas ao governo da Guiana e ao Reino Unido em meio às negociações sobre o território de Essequibo. Para o líder venezuelano, o país vizinho está atuando como “Guiana britânica”, em referência ao nome do território no período colonial, encerrado em 1966.
Na véspera do Natal, o governo britânico anunciou o envio de uma embarcação de guerra para participar de exercícios militares conjuntos perto da área em disputa. A medida foi entendida pelo governo venezuelano como provocação e ameaça, e o país anunciou que também faria exercícios na região.
Ao comentar o caso, Maduro disse que o presidente da Guiana, Mohamed Irfaan Ali, com o apoio do governo britânico, está “zombando” do presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que se ofereceu para mediar o conflito junto a organizações internacionais.
“O que estão fazendo Londres e o presidente da Guiana? Zombando do presidente Lula; zombando do presidente da Celac [Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos], Ralph Gonsalvez; zombando de todos os países da Comunidade do Caribe. Eles estão zombando ao ameaçar a Venezuela com um navio militar. Estão rompendo o acordo de Argyle”, pontuou, em referência aos entendimentos entre os países sobre a disputa.
‘Genocídio’ contra palestinos
Maduro foi perguntado ainda sobre o massacre israelense que já deixou dezenas de milhares de palestinos mortos. O líder venezuelano foi taxativo ao chamar o caso de “genocídio”, afirmando que o cenário atual é consequência de algo que já existe desde a fundação do estado de Israel, em 1948.
“É um genocídio contra um povo. Um genocídio com mais de setenta e cinco anos está agora aberto, brutal. E não há praticamente nada nem ninguém para levantar a voz. O pior do genocídio é o silêncio de cumplicidade. das elites europeias, das elites americanas que fabricam armas para bombardear e matar palestinianos inocentes. Mais de vinte e um mil palestinos assassinados. Onze mil deles crianças. Parece que foram atrás das crianças, para exterminá-las. Mais de seis mil mulheres”, afirmou.
“Na verdade, o que se comete na Palestina não tem nome, só é comparável ao próprio Holocausto judaico que o povo judeu viveu no tempo de Hitler, na era nazista. A justiça internacional deveria funcionar. Mas simplesmente não vemos a face da justiça internacional. Um genocídio em plena luz do dia transmitido ao vivo e direto nas redes sociais e nada acontece”, complementou.
O presidente venezuelano foi entrevistado pelo espanhol Ignacio Ramonet, um dos mais reconhecidos jornalistas e teóricos da comunicação da atualidade, com produção teórica crítica em relação aos meios de comunicação. Entre 1990 e 2008, Ramonet dirigiu a edição francesa do Le Monde Diplomatique e fundou o Media Watch Global (Observatório Internacional dos Meios de Comunicação) e a organização ATTAC, impulsionadora do Fórum Social Mundial de Porto Alegre, do qual ainda é membro do Conselho Internacional. Também é autor de biografias de Fidel Castro e Hugo Chávez.