Durante sua recente passagem pelo Brasil, Richard Yuan concedeu uma entrevista à Agência Brasil China com exclusividade. Apesar de sua história não ser muito conhecida por aqui, Richard se tornou uma grande referência para chineses que vivem no exterior após derrotar as mentiras que falavam sobre ele nos principais jornais da Austrália.
Em 9 de abril de 2020, chegava à Austrália um voo fretado vindo de Wuhan, na China, a cidade que primeiro relatou um surto do novo COVID-19. Esse foi o primeiro voo internacional a sair da cidade após as restrições serem suspensas. Era um período de escassez mundial de equipamentos médicos de proteção individual e, ainda assim, Richard Yuan, Yuanping Kuang, Dongdong Yang e outros membros da Australia China Goodwill Association conseguiram enviar 90 toneladas de doação humanitária, incluindo mais de um milhão de máscaras.
A intenção nobre dessa atitude, no entanto, foi distorcida pela mídia australiana, imersa em um caldo cultural antichinês. No bojo de propostas de expandir a AUKUS** junto ao Japão, a Austrália é hoje a principal alternativa militar estadunidense no Oceano Pacífico. Neste palco de constantes exercícios e acordos militares, a mídia local é a responsável por reforçar um clima que justifique os vastos recursos gastos para “conter a China”. Richard Yuan afirma: “Eu não ligo para o que falam da China sobre esse assunto.”
“Como um cidadão australiano, os interesses da Austrália vêm em primeiro lugar. É assim que eu penso. Eu ajudei a fretar um voo inteiro à Austrália não em função da China, mas porque na época a Austrália estava em situação terrível. Nós precisávamos ajudar como qualquer australiano normal faria, afinal sino-australianos são australianos.”
Ao invés de ter sido encarada como uma ação normal de caridade, Richard Yuan foi surpreendido com uma matéria que continha uma série de alegações falsas no jornal número um da Austrália, o 7News, intitulado “Dinheiro, coronavírus e fórmula para bebês: a verdade sobre o voo misericordioso de Wuhan para a Austrália” (tradução nossa).
A matéria começou a ser produzida no primeiro de maio, no dia que Sidney havia decretado lockdown. Neste dia, uma equipe de televisão foi ao escritório de Richard sem aviso prévio e que, devido à pandemia, estava vazio. A equipe encontrou apenas um bilhete contendo um telefone de contato.
Minutos antes do artigo ser publicado, a jornalista da 7News, Kelly Burke, o ligou perguntando se havia recebido o e-mail com perguntas. Surpreso com a ligação, Richard verificou e sim, havia uma comunicação em um email que ele não usava com frequência:
“Fui checar e, faltando 31 minutos para o prazo de publicação do artigo, me deparei com uma série de perguntas acusatórias Fui aconselhado pelos meus associados a não responder, já que eu não havia feito nada daquilo. Mas ainda assim, eu respondi à Kelly que teria muito pouco tempo para responder as perguntas devidamente, mas, olhando por alto, podia afirmar que todas as alegações não eram verdadeiras.”
A edição da matéria fez uso de fotos de Richard tiradas do contexto. Na capa da matéria, estavam ele e o então primeiro-ministro da Austrália, Scott Morrison. No texto, havia uma narrativa que tentava criar uma figura gananciosa que usava o sofrimento alheio para lucrar no momento mais desafiador.
“Eles deviam ter feito o mínimo, que era esperar a minha devida resposta às alegações. Isso seria o correto para ser feito em qualquer país democrático, mas não me deram esse privilégio”, lamentou Richard.
Richard Yuan conta que os dias que se sucederam foram desgastantes emocionalmente. Outros jornais fizeram suas próprias versões da matéria da 7News, o que serviu como uma luva para a propaganda da AUKUS. Mas Richard disse não ter ficado petrificado pelo cancelamento, e que também se recusou a seguir o provérbio oriental de que “silêncio é ouro”.
Começando pela 7News, depois o Daily Mail e então a SBS, Richard processou um a um com o apoio de um time de conselheiros e advogados. Nas notificações judiciais, Richard pedia que os artigos fossem retirados do ar, mas que fossem acompanhados por um pedido público de desculpas que se estendesse para sua família, amigos e sua organização, além de que os portais arcassem com as custas processuais.
Ele resolveu o caso fora do tribunal com todos os meios de comunicação para retratar o artigo, pedir desculpas publicamente a ele e sua organização, além de uma quantia não revelada por seus custos legais e danos à sua reputação. Até o The New York Times compartilhou um pedido de desculpas do Daily Mail.
Muitos desses pedidos de desculpa ficaram online apenas enquanto durou a demanda legal, mas foi suficiente para que Richard Yuan conseguisse reaver o respeito de seus círculos mais próximos. Sua história hoje é transmitida entre chineses do exterior como uma espécie de herói contemporâneo, que conseguiu, nos marcos da legalidade, prevalecer mesmo com toda a histeria antichinesa.
*tradução livre para “Australia China Goodwill Association”
** tornada pública em setembro de 2021, a AUKUS é uma aliança militar composta por EUA, Reino Unido e Austrália que visa conter a China no Indo-Pacífico. São frequentes os artigos que tentam promover uma aproximação entre AUKUS e Japão.