Convidar Brasil em ano eleitoral foi ‘grande jogada’ da OCDE, diz economista

Um passo importante para a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi dado ontem. A entidade concordou em aprovar um convite para o país iniciar o processo de adesão, depois de anos de hesitação. Entretanto, a iniciativa acontece a nove meses das próximas eleições brasileiras – que poderão redefinir o interesse do próprio país em integrar a entidade, apelidada de “clube dos ricos”.

O novo secretário-geral da OCDE, Mathias Cormann, assumiu o cargo em 2021 disposto a avançar a abertura para novos membros. O conselho de ministros da organização aprovou o convite para seis países de uma só vez – Argentina, Peru, Romênia, Croácia e Bulgária completam o grupo.

O Brasil participa e colabora com a organização há quase três décadas, porém uma solicitação formal de ingresso jamais foi apresentada pelos governos do Partido dos Trabalhadores, que viam com reservas a adesão à entidade. Esse desejo foi manifestado pelo ex-presidente Michel Temer e oficializado por Jair Bolsonaro, em 2018.

“Fazer o convite agora é uma grande jogada da OCDE”, afirma economista Antônio Carlos Alves dos Santos, professor de economia internacional da PUC-SP. “Não tenho a menor dúvida de que ocorrer neste momento é um instrumento de pressão sobre o futuro governo. A OCDE coloca a nova administração numa posição desconfortável de ter de dizer não, se não quiser mais aderir.”.

Papel do Estado

Para Santos, se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva vencer as eleições, como apontam as pesquisas de opinião até agora, este será um tema “bem controverso” dentro do futuro governo. A entidade, de perfil econômico mais liberal, prega maior abertura econômica e combate protecionismos, por exemplo.

“A questão econômica sempre foi um forte entrave para economistas desenvolvimentistas, que têm uma visão diferente da OCDE em relação à participação do Estado”, pontua. “Por outro lado, essa visão de que o Estado devia ser mínimo está sendo questionada, com a pandemia, e pode haver maior flexibilidade agora”, ressalta.

O embaixador Carlos Cozendey, encarregado do Ministério das Relações Exteriores para negociar o ingresso do Brasil, contemporiza. “O Brasil tem cooperado com a OCDE desde os anos 1990, ao longo de diferentes governos, de diferentes partidos. O aumento da participação em comitês e a adesão a instrumentos foi constante neste período”, frisa o diplomata, que atua em Paris, onde se situa a sede da organização que reúne 38 países.

Integração internacional

“Acho que a aproximação com a OCDE tem que ser vista como uma questão de Estado. A OCDE tem uma influência universal. Se você vai ser exposto a esses padrões e acabar tendo que segui-los, é melhor participar da sua elaboração”, observa Cozendey, ao lembrar que Brasília desempenha um papel atuante em instâncias internacionais como o G20.

O embaixador frisa que dos 251 instrumentos da OCDE aos quais os países-membros devem se adequar, o Brasil já aderiu a 103. Brasília também participa formalmente de mais de 30 comitês sobre diferentes aspectos de políticas públicas recomendadas pela organização – uma dinâmica que se acelerou desde o pedido formal de ingresso.

“O quadro que a gente tem hoje é que, em 90% dessas normas, já há uma coincidência muito grande da legislação e da prática brasileira. Às vezes, demanda alguma mudança de legislação ou de políticas”, explica, a exemplo da área tributária, em que reformas estruturais seriam necessárias para adaptar o país aos trilhos da OCDE.

Em outros aspectos, o problema é a implementação de leis já existentes, como as ambientais. “É claro que na área do desmatamento, os países vão esperar resultados e a gente terá de apresentar”, sublinha Cozendey.

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